É preciso reverter o rompimento entre negócios e educação com urgência, diz Ken Robinson, em entrevista exclusiva
Como diagnosticou recentemente Carlos Arruda, especialista em competitividade da Fundação Dom Cabral, o Brasil não tem capacidade humana para se sustentar como um país desenvolvido. A raiz disso pode ser distinta do que pensa a maioria, contudo, pois talentos não faltam; eles são sistematicamente destruídos. É o que diz sirKen Robinson, uma das maiores autoridades mundiais em inovação e educação, não apenas sobre o Brasil, mas sobre boa parte do planeta. Esse britânico que migrou para a Califórnia afirma que, pior do que isso, a relação entre a educação e os negócios foi rompida e o resultado pode ser desastroso.
Em entrevista exclusiva à editora-executiva Adriana Salles Gomes, Robinson alerta para uma revolução silenciosa (indesejável para as empresas) já em curso, diz que a solução está na personalização da educação, compara a inovação com o rock e recomenda aos líderes que se concentrem em criatividade, entre outros conselhos práticos.
Você escreveu o livro Out of Our Minds 11 anos atrás e agora o está relançando com grande impacto —no Brasil, será intitulado Libertando o Poder Criativo. Quero saber se quem leu a primeira edição precisa ler essa também...
Eu digo às pessoas que leram a primeira edição que a joguem fora e comprem esta [risos]. É um livro completamente novo. Muito do que falei em 2001 ainda é verdade, só que aconteceram milhares de coisas nesses anos que não podiam ser previstas, da recessão mundial aos smartphones, iPads e redes sociais. Se um livro é sobre a necessidade e a forma de mudar, tudo isso pesa.
A economia e a tecnologia influenciam tanto assim?
Nem é a tecnologia em si que influencia, mas a maneira como as pessoas a usam, que é imprevisível. Quando o Twitter foi lançado alguns anos atrás, sinceramente, ele me pareceu a mais ridícula das ideias. Mas, nos últimos cinco anos, virou esse fenômeno global, tomando parte em revoluções e tendências de mercado, e ajudou a mudar a forma como as pessoas se comunicam e os assuntos de que tratam. Até eu me converti ao Twitter.
As ferramentas da internet e os games podem ajudar muito a excitar a imaginação e a energizar crianças e jovens, o que é urgente. Agora, não substituem as pessoas na educação. Hans Zimmer, que é um dos compositores de músicas para filmes mais bem-sucedidos do mundo todo —e curiosamente foi expulso de cinco escolas—, me contou recentemente que compõe todas suas músicas no computador, mas faz questão de gravá-las no estúdio com músicos tocando, porque nenhum software substitui a vitalidade e a sensibilidade humanas. Eu tinha tudo isso a dizer e muito mais. Aprendi muito nesses dez anos de intenso contato com as empresas, por exemplo; isso enriqueceu demais minha experiência, que era principalmente com escolas, universidades e governos. E também vir para a Califórnia foi um grande aprendizado.
Sabe o que mudou essencialmente? Ficou muito mais forte a ideia de que temos a tendência de fazer pouco uso institucional do talento das pessoas e que assistimos a um enorme desperdício de potencial humano e possibilidades.
Mas as empresas entendem de fato que há esse desperdício de potencial humano e que ele afeta os negócios?
Esse desperdício afeta a economia inteira! A educação das pessoas e a economia são coisas intimamente ligadas e essa área vai muito mal. Vejo que algumas empresas estão começando a entender a gravidade do problema. Um ponto favorável ao mundo dos negócios é que, nele, as pessoas estão sinceramente interessadas na inovação, apenas não sabem como promovê-la.
Por anos e anos as empresas partiram do pressuposto de que, ao serem formalmente instruídas, as pessoas terão as habilidades, aptidões e competências de que os negócios precisam. Os pais, por sua vez, também presumiam que, uma vez educados, seus filhos teriam emprego e renda. Só que essa relação entre negócios e educação está rompida; nós destruímos talentos.
São fortes essas afirmações, sir Ken.
Sim, e são absolutamente realistas. As escolas estão sendo sufocadas com essas exigências de testes padronizados e, por isso, passam uma visão estreita de habilidades. O resultado é que os futuros adultos perdem o contato com sua criatividade, ironicamente a habilidade mais necessária às empresas na atualidade.
O sistema de educação é baseado em uma série de mal-entendidos entre as comunidades educacionais e as de negócios —e os propósitos comuns de ambas.
Como desfazer o nó? Por exemplo, no caso do Brasil, testes padronizados são a regra absoluta, no acesso ao ensino superior, na métrica de desempenho Enem.
É necessário fazer uma revolução na educação. Uma das razões é que o mundo já se encontra em estado de revolução, pois vem mudando rápida e profundamente. Os desafios que nossos filhos enfrentarão não têm precedentes, seja na área de energia, nas questões culturais, nos alimentos —temos epidemias de inanição e obesidade ao mesmo tempo! Há uma gigantesca e dificílima agenda para a humanidade enfrentar no futuro próximo. O que permitirá que lidem com isso? Nos anos 1920, H.G. Wells, escritor de ficção científica, dizia: “A civilização está em uma corrida entre a educação e a catástrofe”. A educação o permitirá, só que revolucionada. E a revolução já está em curso; como todas as revoluções, começou embaixo e não em cima.
O sonho revolucionário da maioria das empresas no Brasil é o modelo educacional sul-coreano. O que você pensa dele?
O modelo é de diversos países da Ásia, como Taiwan, China, e aconteceu no Japão também. Seu princípio é o de promover uma hipercompetição entre as crianças, fazendo-as esforçar-se para absorver mais informações, passar em provas, fazer tarefas. Acho que é um engano terrível, pois se baseia numa regra válida no século 20 que agora expirou: “Se fizer tudo certo na escola e na universidade, você arrumará emprego”. Por que expirou? Porque isso só funciona quando poucas pessoas têm diploma universitário. E, além de não haver mais essa garantia, os profissionais que chegam às empresas não têm a competência de que elas precisam, porque pagaram um preço enorme por essa obsessão competitiva. Cada criança que passou por esse tipo de sistema e não conseguiu ir para a universidade certa tornou-se um ser humano frustrado, ansioso, deprimido. Então, desperdiçamos, ou destruímos, uma quantidade incomensurável de talentos em nome de um propósito que não é mais verdade.
Você falou em revolução. Que sinais podemos ver?
Um dos motivos pelos quais as pessoas estão usando tanto as tecnologias virtuais é sua insatisfação com a educação tradicional. Preferem aprender sozinhas online. E, quanto mais baratos ficarem os computadores e aparelhos móveis, mais gente fará isso até tomar o controle da própria educação, sem deixar espaço para as instituições.
A mudança de paradigma genuína acontece assim. No século 19, a cidade de Londres dependia de cavalos, que puxavam carruagens e carroças, e havia um pânico geral por causa de toda a urina dos animais acumulada nas ruas, contribuindo para espalhar doenças. As pessoas não acharam uma forma de se livrar da urina, mas se livraram dos cavalos —quando inventaram o carro.
Vão se livrar das escolas... Algum governo já acusa o golpe?
Parece que não, tanto que os governos reagem no sentido contrário, porque estreitam ainda mais a visão nas escolas, aumentam sua dependência de testes padronizados e despersonalizam cada vez mais a educação, tornando-a um processo ainda mais industrial. Eles estão fechando os olhos.
Anarquia na educação soa como fazer justiça com as próprias mãos... É saudável ficar sem instituições? Há como reagir?
Sempre digo a professores e diretores de escolas, pelos quais tenho grande respeito, que, se mudarem o jeito como ensinam e o que fazem na sala de aula, estarão revolucionando o sistema educacional. É exatamente assim que funciona a mudança social. Quando eu era jovem, na Inglaterra, todos fumavam e ninguém usava cinto de segurança em carro. Hoje, quase ninguém fuma e todos usam cinto. Uma vez que os hábitos mudam e uma nova ideia se torna vital, ela se espalha e revoluciona a cultura rapidamente.
As empresas podem ter um papel a cumprir aí? Você costuma falar em parcerias criativas entre empresas e escolas...
Gosto de citar a iniciativa “capitalismo consciente”, que partiu do empresário John Mackay, da varejista Whole Foods Market, e vem atraindo cada vez mais empresas. Seu raciocínio é de que, apesar de as companhias serem criadas para gerar lucros, elas já podem escolher entre formas éticas e não éticas de fazê-lo. No futuro, talvez precisem ser éticas, desenvolvendo novos papéis ligados a responsabilidade e sustentabilidade em conjunto com as comunidades. Isso vale tanto para a educação criativa dentro da própria empresa, como faz o Google, por exemplo, quanto para sua conexão com a comunidade externa, que pode ser feita com as escolas. Nos EUA, há toda uma rede de escolas chamadas Big Picture Schools, em que as crianças podem passar dois dias por semana trabalhando em organizações que estão fazendo o que lhes interessa, como estúdios de design, clínicas veterinárias, delegacias de polícia etc. E isso está provando ser muito eficaz. Além disso, muitas empresas mantêm programas internos de educação, contabilizando isso como parte do trabalho, e é muito bom. A maioria vê como investimento, não despesa, e não corta o orçamento na hora do aperto.
Que reforma você sugeriria para o governo brasileiro?
Certamente eu aconselharia o Brasil a olhar menos para a Coreia e mais para a Finlândia, embora entenda que é difícil comparar um país pequeno com um grande. Observe o sistema PISA, da OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico], que compara a performance de alunos de diferentes países em matemática e ciências, particularmente: a Finlândia sempre se destaca no topo das avaliações PISA, mas não pratica testes padronizados, nem é obcecada por matemática e ciências. Reforça humanidades, artes, educação física, projetos práticos, jogos e, por incrível que pareça, vai muito bem em ciências e matemática. Enquanto a taxa de desistência da escola nos Estados Unidos fica em torno de 30%, na Finlândia é zero.
Por conta da necessidade de inovar, o Brasil também anda muito preocupado com a falta de interesse das crianças em matemática e ciências. Humanidades lhes interessam muito mais. O que explica o caso finlandês?
Em primeiro lugar, é preciso entender que criatividade e inovação não dependem nem só das ciências, nem só das artes, mas de como as duas áreas trabalham em conjunto; hoje o crescimento econômico de um país depende de múltiplos talentos. Agora, há um estudo muito interessante do professor Vivek Wadhwa [autoridade em inovação do Vale do Silício] sobre o histórico educacional dos líderes de cerca de 650 empresas de alta tecnologia do Vale. Contra o senso comum, 60% ou mais deles têm formação em artes ou humanidades, e mesmo os cientistas que lideram essas empresas foram para escolas com método alternativo, como Montessori, quando eram crianças. Curioso, não?!
Muito curioso! Você conhece o educador brasileiro Paulo Freire? Talvez por ele ser associado à esquerda, a classe empresarial não presta muita atenção a suas lições...
Sou um grande admirador do trabalho de Paulo Freire e ele me inspirou muito quando eu era estudante. Suas preocupações com a necessidade de cultivar talentos e habilidades individuais e educar a sensibilidade coincidem exatamente com o que falo. Também compartilho suas preocupações com essa institucionalização da educação que aumenta as diferenças entre os estudantes. Se precisamos de múltiplos talentos, precisamos de todos. Todas as crianças nascem com talentos maravilhosos; estes só não podem ser destruídos pelo sistema, e sim alavancados.
Agora, devo dizer que o Brasil não está sozinho nesse engano: recentemente o presidente Obama falou sobre promover a inovação e criatividade no sistema educacional dos EUA, ligando isso ao crescimento econômico, e referiu-se apenas a ciência, tecnologia, engenharia e matemática. É um erro gigantesco. No Reino Unido, em 1999, o governo me pediu para desenvolver uma estratégia para a criatividade no sistema educacional, o que virou o relatório All Our Futures, e já naquela época montamos um grupo de 15 pessoas que incluía desde músicos, escritores e dançarinos até economistas, cientistas e líderes empresariais.
Dizem que a gente muda por duas coisas: amor ou medo. Os gestores poderão começar a agir por uma dessas emoções?
Temos uma grande chance de os gestores, e as pessoas em geral, agirem, porque também são pais, preocupados com o futuro de seus filhos. Estou, aliás, escrevendo um novo livro, a ser lançado em 2013, sobre como achar “o elemento”, essa paixão que todos devem procurar em si, seu talento natural. A primeira regra é que não adianta nem os pais nem a escola forçarem uma criança a aprender matemática. Se ela não quer, é por achar entediante ou muito difícil. A forma de resolver o problema é investir em professores e recursos melhores para a educação da ciência, e não empurrá-la excluindo outras matérias. Para comprometer as crianças com a educação, você tem de se comprometer pessoalmente com elas, a fim de energizá-las. Elas querem ser estrelas do rock ou jogadores de futebol porque isso excita sua imaginação.
Um amigo meu, o músico de rock Brian Cox, agora é professor de astronomia em Manchester, na Inglaterra, e está apresentando uma série de documentários na BBC sobre astronomia. Ele se parece com um astro de rock, mas sua outra paixão é, e sempre foi, astronomia. O fato de ele falar apaixonadamente sobre astronomia na BBC aumentou enormemente o número de inscrições para o curso universitário de astronomia. Ele excitou a imaginação dos jovens. O empresário Peter Diamandis está tão interessado em viagens no espaço porque, quando criança, sua imaginação foi ativada pela série de TV Star Trek [Jornada nas Estrelas]. Eu sempre defendo a personalização da educação, tanto pela percepção de quão diferentes nossas crianças e seus talentos são como pelo reconhecimento da importância de educar —a educação precisa ser vista como uma forma de arte.
Você tem dois filhos. Como foi sua “educação-arte” com eles?
A primeira observação é que eles são completamente diferentes em termos de talentos e interesses, o que é parte biológico, parte cultural. Essa é uma das razões pelas quais precisamos obrigatoriamente personalizar a educação.
Isso vale para programas de desenvolvimento de empresas?
Sem dúvida, se a empresa está interessada em inovação, e não apenas em eficiência.
Voltemos a seus filhos...
Hoje, meu filho, James, tem 27 anos e minha filha, Kate, 23, mas, quando eram crianças, minha esposa e eu estávamos sempre prontos a tentar achar a melhor escola para cada um individualmente. Minha filha, por exemplo, era muito menos impelida por trabalhos acadêmicos convencionais, porém mostrava ser ótima escritora, dançarina, com excelente gosto para design e muito hábil no relacionamento com as pessoas. Já meu filho é um ótimo ator, brilhante com os idiomas, mas também muito interessado em teorias e trabalhos acadêmicos convencionais, com uma mente voltada para a abstração. Então, mais por mérito de minha esposa, devo dizer, sempre tentamos colocá-los nos ambientes que fossem melhores para eles, e que eram distintos.
Isso me parece quase heroico! Sua mulher trabalhava fora?
Sim, era professora de teatro em uma escola de Liverpool; dava aulas para crianças de 10 anos em uma sala de 42 alunos. Mas ela foi muito pragmática e isso era prioridade nossa. Não digo que sempre acertamos, porque é um processo e requer muito improviso. Mas o fato é que o que funciona para uma criança não funciona necessariamente para outra. Quando viemos para a América, tentamos colocá-los na mesma escola e tivemos de mudar quando vimos que não funcionava para a Kate. Podíamos ver a luz indo embora de seus olhos e a tiramos de lá para recuperar seu brilho.
Como resumir as recomendações do Robinson Report?
Sua essência vai no sentido de criar um ambiente onde as pessoas se sintam confiantes para tentar, onde novas ideias surgirão e começarão a florescer. Inovação, assim como educação, é um processo orgânico, não mecanizado. Consiste em dar às pessoas um senso de inspiração, de possibilidades, de encorajamento e, principalmente, de permissão.
Trabalhei com os ministros da Educação, Indústria e Comércio e Cultura da Irlanda do Norte para desenvolver um plano de implementação do relatório chamado Unlocking Creativity [Destrancando a Criatividade]. Sei que muitas recomendações foram executadas, sim; contaram-me que o relatório gerou cerca de 160 milhões de libras de investimento na época e levou a muitos novos negócios. Agora, Oklahoma [EUA] é que quer aplicar essas ideias para se tornr “o estado da criatividade”.
No contexto corporativo, a questão também é a permissão?
Pense em cultura organizacional como hábitos mais habitat —hábitos são as formas de comportamento e os valores que as encorajam, a maneira como a organização é gerenciada, e o habitat é o local físico em que as pessoas trabalham. Todas essas coisas têm grande impacto no que as pessoas sentem como permitido. Se está na cultura da empresa, a inovação é permitida. Se não está, não é. A maioria das companhias está interessada em inovação, mas esta não se encontra em seus hábitos e habitat, não é permitida. E não funciona.
Uma organização hierárquica comporta inovação? Estudos antropológicos detectam muita hierarquia no Brasil.
Hierarquia serve a quem busca eficiência e status quo, mas não se surpreenda se não houver inovação nesse ambiente. Inovação requer múltiplas lideranças, não uma única, como ocorre na hierarquia. É como o rock; não há apenas um jeito de fazer rock, mas muitos, e essa variedade é fundamental.
Vale a pena entender a relação entre a imaginação, a criatividade e a inovação numa cultura organizacional. A imaginação, fundação de tudo, é a capacidade de trazer a nossa mente coisas que não são reais a nossos sentidos. Todos os seres humanos têm isso e devem ser encorajados a mostrar. A criatividade é o processo de ter ideias originais e gerar valor a partir daí —é um processo, não um evento isolado; requer disciplina e uma visão crítica das ideias e um balanceamento interessante entre liberdade e controle. A inovação é colocar as boas ideias em prática. As empresas precisam cultivar a imaginação de seu pessoal, dar-lhe habilidades para o processo criativo e criar um ambiente em que tudo isso seja valorizado e encorajado. Com esses fatores aplicados, as ideias virão, geralmente de fontes inesperadas, não só das pessoas criativas, como reza a lenda.
Mas, em uma empresa hierárquica, isso dificilmente vinga, porque muitas boas ideias vêm de baixo e porque acontecem de maneira melhor quando fluem entre disciplinas diferentes, em equipes multidisciplinares.
Você fala em líder criativo. Qualquer líder pode ser criativo?
Sim, potencialmente. O líder não precisa entender a inovação, e sim a criatividade. Deve pensar seriamente sobre ela. Como eu disse a Tony Blair [ex-primeiro-ministro britânico] quando ele foi eleito, educação diz respeito a promover a criatividade e entendê-la, mas o governo tinha políticas educacionais que a destruíam. E digo o mesmo aos líderes de empresas.
Explique melhor o processo disciplinado da criatividade...
Não tem nada a ver com perder o controle. Você não pode ser um músico criativo se não sabe tocar um instrumento, nem um cientista criativo se não souber matemática.
Um dos grandes líderes atuais é Richard Branson e não por ser carismático. De um lado, ele é muito liberal, porque se limita a inspirar as pessoas a fazer as coisas, mas seu grupo empresarial é bem disciplinado. Há o balanceamento.
A visão crítica é fundamental e John Lennon ensina isso. Entrevistei Paul McCartney para meu livro The Element, de 2009, e ele descreveu como os dois compunham: começavam com o que viesse à cabeça —frase ou acorde— e não levantavam enquanto não terminassem. Ao final de uma dessas sessões, saíram para beber, e Paul disse a John: “E se não conseguirmos nos lembrar da música pela manhã?”. E John respondeu: “Se não pudermos nos lembrar, por que mais alguém se lembraria?” [risos].
E como desenvolver a imaginação, achando seu elemento?
É uma busca primeiro interna, em que se aprende mais sobre si, e depois externa, para experimentar coisas novas e se pôr à prova. É a jornada dupla de descobrir a paixão e construir a atitude. Como? Quebrar a rotina é uma forma.
“A insatisfação com a educação tradicional leva as pessoas para as tecnologias virtuais”
O ritual importa, por Ken Robinson
Como é tornar-se um sir? Você vai ao Palácio de Buckingham, em Londres, curva-se diante da Rainha Elizabeth II e ela coloca uma espada em seu ombro. É grandioso! Eu fiquei muito orgulhoso, por três motivos: primeiramente, porque inspirar tanta confiança nas pessoas é um sentimento maravilhoso —você não pode se candidatar a ser “sir”, isso tem de partir da vontade alheia; em segundo lugar, porque enchi minha mãe de orgulho —ela estava com 84 anos, morreu dois anos depois e creio que morreu feliz, porque, para sua geração, a Rainha tem uma importância significativa; em terceiro, porque a Rainha é uma pessoa extraordinária, muito querida.
Rituais e mitologias são extremamente importantes. Eu era estudante nos anos 1960 e 1970 e muitos de meus colegas não queriam ir à cerimônia de graduação, achando que era ultrapassada e um tanto ridícula. Estavam errados. Esses ritos de passagem celebram conhecimentos e conquistas e nos proporcionam um momento de pausa e reflexão, rodeados de pessoas que amamos e/ou admiramos, para entender melhor nossos sentimentos, preparando-nos para os próximos conhecimentos e conquistas na longa busca que é nossa vida. É como a jornada do herói descrita por Joseph Campbell, e o verdadeiro benefício desses ritos de passagem é espiritual —no sentido de nos deixar cientes de nossas conquistas e nos fazer sentir orgulho.
Acredito que as empresas também devam utilizar rituais para manter uma cultura saudável de inovação, com o cuidado para que esses rituais não sejam artificiais, mas tenham significado. Eu estive em Las Vegas há pouco tempo, em uma empresa chamada Zappos, que é muito bem-sucedida, com uma cultura interna maravilhosa, e a cada trimestre eles fazem um ritual desses, que é uma reunião chamada “All Hands” [Todas as Mãos], em que juntam todos os colaboradores em um grande teatro, para celebrar sinceramente as conquistas das pessoas, financeiras e de outros tipos.
“Sempre defendo a personalização da educação; deve ser vista como uma arte”
Saiba mais sobre Ken Robinson
Em 1998, o educador Ken Robinson, professor da University of Warwick, liderou uma comissão do governo britânico encarregada de analisar as relações entre educação, criatividade e economia. O resultado, o relatório All Our Futures, que ficou mais conhecido como Robinson Report, teve imensa repercussão mundial e suas recomendações passaram a ser adotadas por atores tão distintos quanto o governo da Irlanda do Norte (como parte do processo de paz) e o de Singapura. Desde então, tornou-se interlocutor frequente de líderes governamentais e empresariais em busca de inovação. Robinson foi condecorado Cavaleiro do Império Britânico —“sir”— em 2003 e incluído entre “as principais vozes do mundo” em 2005 pelas revistas Time e Fortune e pela emissora de TV CNN, dos EUA. A real popularidade, contudo, veio em 2006, com uma palestra TED, que se viralizou pela internet de maneira impressionante.
Autor de oito livros —entre os quais, Libertando o Poder Criativo, que será lançado pela HSM Editora—, sir Ken, como costuma ser chamado, virá pela primeira vez ao Brasil em novembro próximo para falar aos gestores na HSM ExpoManagement. Ele é admirador declarado de Paulo Freire e Miguel Nicolelis e se diz ansioso por conhecer o País, que associa a uma criatividade abundante. Nascido na Liverpool dos Beatles, o especialista morou na Stratford-upon-Avon de Shakespeare e agora vive na Califórnia de Hollywood, dedicando sua vida a garimpar talentos, individual e coletivamente. Sir Ken trata disso tanto em Libertando o Poder Criativo como em seu próximo livro, Finding Your Element (uma continuação de The Element), que deve ser lançado em maio de 2013, com dez lições que pretendem ajudar cada um a descobrir e explorar seu verdadeiro talento.