Gustavo Cisneros e Adriana Cisneros, diretor e presidente do Grupo Cisneros, falam do estilo da gestão da família que já dura mais de 80 anos, construiu um império e tornou-se uma das maiores empresas de mídia e entretenimento do mundo
Transcrição:
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Fale sobre os princípios do sucesso de uma empresa familiar bem-sucedida. Temos a representante de uma terceira sucessão familiar aqui.
A primeira regra é criar genes que passem de uma geração para outra. Se não tiver os genes, não se preocupe.
Certifique-se de contratar executivos excelentes e que os filhos sejam donos, mas não executivos. É uma combinação melhor.
Cercar-se de pessoas muitos boas e muito empreendedoras que concordam com você, mas que também possam te guiar em novas formas de fazer negócios, novas aventuras.
É sempre melhor ter visão do que não ter visão. Se eu pudesse escolher entre ter visão e ser o melhor contador do mundo, eu escolheria ter uma visão.
Os grupos precisam saber para onde estão indo e precisam mudar muito rápido. Na América Latina, por exemplo, o fato da maioria dos negócios ser familiares
é muito bom, pois poderemos sobreviver melhor à crise. Temos visão a longo prazo, nossas finanças são melhores, temos melhores executivos e melhor senso de como lidar com a crise.
Já passamos por isso antes, está no nosso DNA. Ou seja...
Essa é a minha opinião. O que você acha, Adriana? - Gostaria de saber sua opinião. - Acho que outra coisa importante é a responsabilidade da geração mais velha
de transmitir a mensagem. Os valores familiares devem ir além da casa, pois são os valores familiares que determinam uma empresa familiar.
Acho que é função dos pais nos ajudar a ver como eles usaram esses valores para gerenciar os negócios. De certa forma, é por isso que somos tão bem-sucedidos.
Quando você tem uma família com mais de um filho, tem outros filhos, eles crescem... Como agir se você perceber que um filho tem mais talento que os outros?
Como lidar com isso sem causar atritos familiares? Não acho que seja questão de talento, é uma questão de chamado. Eu senti esse chamado, senti que queria trabalhar
para a minha família. Eu tinha essa conexão com meus pais e me pareceu a coisa natural para fazer pelo resto da minha vida. Meus irmãos também são talentosos, mas eles têm outros interesses.
O motivo da nossa família ser tão harmoniosa é porque meus pais, desde cedo, nos permitiram correr atrás dos nossos interesses e nos apoiaram no que escolhemos fazer.
Como eu disse, é bom deixar claro que ser dono é muito bom. Se você quiser ser só dono, tudo bem, as horas são melhores. Você não precisa acordar às cinco e dormir à meia-noite,
e você pode contribuir como dono, seja nos negócios ou nas fundações dele. Mas se você se propuser a ser um executivo, terá que cumprir as regras e se dedicar dia e noite, pois essa é a única forma.
Como você é aceita por executivos que não são membros da família? - Qual é a melhor forma? - Bem...
Acho que é preciso ter executivos com muita autoconfiança. Se eles não tiverem autoconfiança, eles ficarão muito inseguros.
Primeira coisa. Ou seja, talento e pessoas com egos que entendam sua função e não se sintam ameaçados pela geração mais jovem.
Acho que tem outra coisa, acho que se eu olhar os principais executivos, que trabalham conosco há mais de 30 anos, eles entendem totalmente que o sucesso da nossa empresa
deve-se ao fato dela ser uma empresa familiar e, quando eu comecei a trabalhar oficialmente para a família, esses executivos me deram muito apoio e incentivo
porque eles viram que a tradição familiar iria continuar e eles valorizam essa experiência. Os executivos mais jovens são um pouco diferentes.
É preciso trabalhar muito para provar que você é a pessoa certa para o cargo. Como manter o espírito empreendedor ao longo das décadas?
Empreendedorismo é fogo. Você tem ou não tem. Conheço muitas famílias americanas, amigos próximos que tiveram gerações sem fogo.
Não vou dizer os nomes, mas existem muitas.
Às vezes, o fundador produz fogo suficiente para 3, 4 ou 5 gerações, mas é um mistério. Às vezes temos, às vezes não. Se não temos, devemos ser espertos
para sair de cena e deixar a gestão para os profissionais. Sermos os donos por um tempo. Você pode esperar a nova geração. Na nossa próxima geração, temos
nove netos. Ou seja, um, dois ou três deles provavelmente terão o fogo. Mas quem sabe, talvez não. Mas acho que, do meu ponto de vista,
do lado corporativo, você pode ter uma estrutura que permite o empreendedorismo ou uma estrutura formulada para não permitir o empreendedorismo.
Não existe certo ou errado, são metodologias diferentes. No nosso caso, meu pai sempre teve uma estrutura na empresa que permite que nossos funcionários pensem de forma criativa,
temos muitos inovadores trabalhando conosco e muitas ideias são geradas, mas não apenas geradas, há formas de fazê-las acontecer e essas ideias muitas vezes redirecionam nossos negócios.
Ser uma família de sucesso e uma empresa de sucesso... Gosto de ter ambos, porque só um deles não ganha o jogo. Vocês já devem ter visto muitas famílias pelo mundo e novas gerações.
Que erros elas cometem, que você olha e diz: "Meu Deus, como isso pode ter acontecido?" - Isso acontece? - Bem...
Se você olhar a Índia, por exemplo,
o Tata Group está numa encruzilhada. O Sr. Tata é muito capaz, um ótimo empreendedor e o último da linha.
Eles são um conglomerado de empresas muito solto que sempre teve liderança familiar. Se eles perderem a liderança familiar, terão dificuldade
para encontrar essa pessoa. Será muito difícil após dez gerações e isso... Mas o Sr. Tata está gastando metade do tempo dele
procurando essa pessoa.
Outras famílias que não vou especificar
estão em declínio por causa de brigas. Brigas familiares destroem o espírito da família de uma forma que não tem volta.
Vi muitas famílias na Europa e nos EUA terem brigas tremendas que nunca podem ser consertadas. Vou colocar de outra forma. Harmonia familiar é muito importante
e é parte do trabalho da Adriana, como já foi minha, como executiva... Uma das funções desse trabalho é harmonia familiar. E sempre que falta harmonia familiar,
os grupos são desfeitos e vendidos por motivos pequenos.
O conselho familiar que instauramos agora tem como função manter a harmonia familiar trazendo a ideia de todos e garantindo que todos participem e se sintam donos.
Como você planeja... sei que você tem filhos pequenos. Como você pensa em fazer eles gostarem dos negócios como você gosta? Você tem alguma estratégia, ideias ou exemplos que aprendeu...
- O que você quer dizer com gostar? - Gostar de trabalhar, porque às vezes, quando você nasce numa família bem-sucedida, com muita riqueza, a preocupação dos pais bem-sucedidos
é se os filhos, por terem nascido ricos, vão valorizar o trabalho tanto quanto eles. Essa é uma das principais preocupações das pessoas. Entendo o que você está dizendo.
Para você ter uma ideia de como fomos criados, tivemos uma vida muito normal quando éramos crianças. Nossos pais eram muito estritos sobre isso,
sempre tivemos menos que nossos amigos e tínhamos que trabalhar muito para ter as coisas. Nossos pais nos ensinaram, na Venezuela, que tínhamos que trabalhar no verão
e que tínhamos que fazer o máximo de estágios possíveis, o que era muito raro. Meus amigos da Venezuela não trabalhavam no verão. Nós tentamos muito fazer o mesmo com nossos filhos.
É uma questão de valores familiares. São os valores familiares que aprendi com meus pais e que eu tento passar para os nossos filhos. Meus irmãos fazem o mesmo.
Sei que vocês trabalham com o John Davis há alguns anos. Qual a importância de ter uma voz de fora nos negócios familiares? Ele traz uma perspectiva externa.
Pura. Além da experiência de ter trabalhado com muitas famílias. Ele já viu de tudo.
Qualquer problema que você passe para ele, seja qual for, ele já viu antes, de alguma forma, e ele pode dizer: "Bom, não é tão ruim. Tem uma solução para isso".
Acho que ele trouxe isso ao nosso grupo. O que você acha, Adriana? Acho que, para mim, foi muito importante trabalhar com ele
porque ao trazer alguém de fora você consegue neutralizar a situação. Lidar com a família, principalmente no início,
é uma tarefa muito emocional. E como uma boa família latina, nós exageramos na emoção. E o John, como um consultor externo, deixa a emoção de lado e te ajuda
a olhar com clareza para o que precisa ser feito, para quem precisa aprimorar certas habilidades e o objetivo máximo é ser uma família responsável
que pode ser dona de um negócio.
Vocês têm uma empresa de sucesso, mas uma empresa muito diversificada. Como manter o foco em um negócio diversificado? Bem...
Se você é o proprietário ativo no negócio, um executivo talentoso, você trabalha horas extras. Só posso dizer isso.
É um trabalho 24 horas, não há outro jeito, eu sei. Você pode ter sistemas e tecnologia sofisticada, mas no fim das contas, é suor.
Depois disso, mais suor. E depois, mais suor. Se não quiser suar, você terá que ter um negócio fácil, com pouca quantidade.
Venda só na América Latina, concentre-se nos EUA, seja um banco privado, coloque seu dinheiro para ser administrado em Wall Street. Seja diferente. Isso não é um problema.
Não tem nada de errado. Você tem que ter uma ideia diferente sobre o que cada geração vai fazer. Mas trabalhar na América Latina é um inferno, você sabe.
Mas nós tentamos. Mas se não tiver o executivo e o sucessor adequado, em vez da América Latina, eu mudaria tudo para os EUA.
Qual o seu conselho para conselhos familiares? Para a nossa audiência?
Seja proativo e forme o conselho familiar o mais rápido possível. Tenha uma estrutura e um plano, e leve muito a sério. O conselho familiar
é como uma unidade de negócio. O conselho familiar deve agir como se estivesse numa reunião de negócios. Acompanhe. E faça isso rápido, eu diria.
Sim, faça rápido e bem. Certifique-se de que todos estejam felizes e harmoniosos, isso leva tempo. Todas as pessoas na minha posição, quando eu pergunto:
"Quanto tempo você dedica à harmonia familiar?" Elas sempre respondem entre 30 e 50%. Isso é loucura.
Mas, quando as famílias crescem e ficam populosas, a harmonia familiar se torna muito importante, principalmente para a terceira e quarta geração.
Se você formar um conselho familiar cedo para lidar com essas questões, elas se tornam controláveis. Mas o conselho familiar precisa ser ouvido, ele não é ilustrativo.
É pra valer, ele é o coração da empresa. Quem pode ser parte do conselho? Só a família ou gente de fora... - Depende... - Maioria familiar.
Depende, existem muitas combinações. Algumas famílias começam apenas com membros diretos da família, executivos ou não.
E, com o tempo, muitos conselhos familiares escolhem trazer consultores para integrar o conselho. Acho que é questão do que funciona para cada família.
Eu recomendo que, no começo, seja apenas a família para que a discussão possa ser bem aberta. Quando se tem questões familiares,
é bom resolvê-las com privacidade. Quanto mais públicas elas se tornam, mais difíceis ficam de resolver. Meu conselho é fazer em particular, até que você esteja maduro
e todos estejam maduros para receber gente de fora. As pessoas de fora podem ter um papel muito importante. Toda família, em qualquer negócio, passa por crises.
Como administrar crises para que elas não afetem a família? - Crise nos negócios? - Isso. Quando vocês discordam, ou pensam diferente.
Precisa haver liderança, uma voz definitiva. Em uma ocasião em particular, quando a família se reúne, mesmo que nem todos concordem, uma pessoa precisa assumir a liderança.
Não pode haver duas vozes. Se houver duas vozes, você vai falhar e lamentar para sempre. Tem sempre uma pessoa na família que se destaca na hora certa.
Liderança. Cercar-se de gente boa é muito importante. Não haver brigas é muito importante. Elas não podem ser resolvidas depois.
A liderança em tempos de crise é extremamente importante.
Você fundou uma empresa na América Latina que tornou-se global. É algo raro, a maioria das empresas globais são americanas e japonesas. Que conselho você daria para empresas familiares terem coragem de sair pelo mundo,
criarem uma marca global e fazerem negócios no exterior? Já vi muitas empresas brasileiras fazendo isso.
O grupo Budweiser agora é uma empresa brasileira, começou com uma empresa pequena e tornou-se gigante mundialmente.
É uma empresa muito brasileira. O alto gerenciamento é todo brasileiro e os donos são diversificados. Esse é um exemplo de que
aprender o negócio em um país, o que é muito difícil, porque trabalhar no Brasil é muito difícil, sem dúvida. Muito mais difícil que trabalhar na Europa ou na Ásia,
ou nos EUA. Então quando as equipes brasileiras vêm gerenciar essas empresas, é mais fácil, não tem segredo. Na América Latina temos tantos problemas diariamente
que, quando vamos para fora, achamos tudo mais fácil. Mandamos um pedido e ele é respondido. Em nossa cultura, temos que lutar para ter uma resposta.
Se você tem disciplina no seu próprio país, você tem bom acesso a informações e a pessoas que fecham negócios. Fluxo de negócios é muito importante.
Para ter fluxo de negócios é preciso viajar, conversar com as pessoas, ter um bom banqueiro. Só alguém de fora pode te fornecer isso.
Fluxo de negócios nunca vem de dentro.
Adriana, o que você aprendeu com o seu grande pai?
Aprendi que tenho muito a aprender. Acho que o processo está só começando para mim. Eu o admiro tanto quanto admiro minha mãe, eles são
muito disciplinados no que fazem, mas, o mais admirável, que espero fazer da mesma forma que eles, é que sempre há um aspecto social
- no trabalho deles. - A Fundação... Cada negócio que eles iniciam, cada iniciativa, sempre há uma forma de tentar dar uma vida melhor para as pessoas na América Latina.
Acho isso muito poderoso.
Focamos nosso trabalho na educação. Meus pais são comprometidos a ajudar os países a melhorar a educação. Achamos que com educação teremos cidadãos melhores
no nosso país, o que ajudará a todos, inclusive o nosso negócio.
Adriana e Gustavo, obrigado pela entrevista e por terem vindo até aqui. Obrigado. - Obrigada. - Obrigado.