Em agosto do ano passado, analistas militares dos Estados Unidos apareceram na imprensa anunciando que as mudanças climáticas passaram a ameaçar a segurança do país. Mesmo com o tom calmo usual, os oficiais se mostraram alarmados diante das consequências ameaçadoras, como o aumento do nível do mar e o derretimento das geleiras. Algumas bases militares, por exemplo, podem ficar submersas e outras atingidas por tempestades cada vez mais fortes.

Mais ameaçadores, entretanto, seriam os efeitos secundários: seca, falta de alimentos, migrações em massa, pandemias e instabilidade política. Qualquer um desses eventos poderia demandar uma resposta humanitária ou mesmo intervenção militar, o que implicaria o envolvimento das Forças Armadas norte-americanas.

As afirmações tiveram ampla repercussão no país, motivando discussões centradas em preocupações militares e de políticas públicas. No entanto, o tema deveria interessar da mesma forma os executivos de negócios e líderes empresariais, por duas razões distintas.

Nike, Unilever, Walmart, Rio Tinto e Chevron, entre outras empresas, não escolheram enfrentar a sustentabilidade; foram obrigadas a fazê-lo

Em primeiro lugar, o alerta vem de fontes isentas nesse debate sobre como devem enfrentar as mudanças climáticas e, ainda assim, descreve uma gama de consequências para o mundo real. Isso faz com que seja um argumento mais persuasivo do que o usual sobre quão significativamente os desafios da sustentabilidade alterarão a forma como o mundo funciona. Não apenas do ponto de vista ambiental, mas também social, político e econômico.

Em segundo lugar, prova que uma pessoa não precisa ser diretamente afetada pelo clima para que isso mereça sua atenção. Os efeitos serão tão grandes que uma das maiores e mais poderosas organizações do mundo –as Forças Armadas dos Estados Unidos– discute uma estratégia para enfrentá-los.

Ao longo das entrevistas para o projeto Business of Sustainability (negócio da sustentabilidade), ouvimos muitos presidentes de empresas e especialistas em gestão que já estão um passo à frente dos militares norte-americanos. Eles não falam do tema só teoricamente, mas em termos concretos, sobre como as forças relacionadas à sustentabilidade mudarão as práticas de gestão, tanto direta como indiretamente.

Neste artigo, listamos oito tendências que ouvimos dos entrevistados:

1.Planejamento. Você não precisa encontrar a sustentabilidade; ela é quem vai encontrá-lo.

A sustentabilidade mudará os modelos de gestão porque os negócios não conseguirão evitá-la. Nike, Unilever, Walmart, Boral, Rio Tinto, Chevron, entre outras empresas [e brasileiras como Natura e banco Santander/Real poderiam ser acrescentadas à lista], têm histórias para contar de como foram empurradas para enfrentar questões de sustentabilidade mesmo antes de elas chegarem a sua agenda estratégica.

A pressão pode vir de ampla gama de fontes: acusações públicas de práticas trabalhistas antiéticas; ONGs que interrompem práticas empresariais ou ameaçam a percepção sobre a marca; escassez inesperada de recursos; uma comunidade que deixa de fornecer mão de obra; consumidores que demandam produtos sustentáveis ou, de forma genérica, querem que a empresa adote uma postura amigável em relação à sustentabilidade; concorrentes que mudam as condições de um setor de atividade com inovações relacionadas à sustentabilidade; investidores.

“Quando vou a uma conferência em alguma parte do mundo, costumam me perguntar sobre nossos programas para preservar as áreas de pesca”, disse o presidente de uma empresa cujos produtos incluem pescados e derivados. “Eles dizem: ‘Vocês só fazem isso porque têm um compromisso com a sustentabilidade, não por ser um bom negócio’. É claro que temos motivos de negócios. Em primeiro lugar, na verdade, veio o problema de negócios. Não é um truque de relações públicas. Nós enxergamos problemas de matéria-prima vindo em nossa direção. Não podemos ficar sem peixe.”

2.Produtividade. A solução dos 16%.

Todos os executivos com experiência em sustentabilidade mencionam benefícios nos resultados finais da empresa obtidos com economia de energia e ganhos de eficiência no uso de recursos, mas mesmo eles ainda ignoram o que muitos pensadores de gestão afirmam ser o maior retorno por agir de forma sustentável: aumento da produtividade da mão de obra.

Estudos, assim como evidências do dia a dia, indicam um aumento no comprometimento e na eficiência dos funcionários quando as empresas adotam estratégias de sustentabilidade. Além disso, como muitos pensadores destacam, locais de trabalho projetados e administrados a partir de princípios de sustentabilidade produzem benefícios de desempenho, independentemente do fato de a sustentabilidade ser parte da missão da empresa.

Com os esforços pela sustentabilidade, os gestores descobrem fatos sobre suas organizações e operações que costumam surpreendê-los

“Prédios eficientes, onde há maior conforto térmico, visual e acústico, em que você pode ver o que está fazendo, ouvir seus pensamentos, sentir-se mais confortável e aproveitar um ar limpo, têm, em geral, uma produtividade de mão de obra nos escritórios 16% mais alta”, afirma Amory Lovins, do Rocky Mountain Institute.

Segundo ele, os ganhos nos resultados finais da empresa com o aumento da produtividade estão entre 1 e 1,5 vez maior do que com a economia de energia.

3. Reputação. Um atalho para gestão da qualidade.

O presidente da Global Business Network, Peter Schwartz, resume a visão de muitos dos entrevistados, apontando uma crescente tendência de avaliar as empresas segundo a forma como elas se saem em indicadores de sustentabilidade. “Fica claro que uma empresa que é rigorosa e preocupada com o que faz, e, então, manifesta essa preocupação em práticas de sustentabilidade, provavelmente será rigorosa e preocupada com finanças e mercados e com a qualidade técnica dos produtos, assim como, provavelmente, todo o resto”, afirma. É difícil avaliar a gestão da qualidade de uma empresa estando do lado de fora. “O desempenho em sustentabilidade acaba sendo um bom atalho para isso”, acrescenta Schwartz.

“Costumávamos pensar no desempenho em segurança só de uma forma: se a empresa tinha um histórico de redução de dias de trabalho perdidos e de registros de acidentes, seus números provavelmente eram positivos, com o moral dos funcionários em alta e clientes atendidos no prazo –e com produtos de qualidade. Mas, agora, isso é insuficiente. A sustentabilidade está se tornando um novo indicador”, diz um executivo do setor de produção mineral.

4.Estratégia. Um ponto de vista privilegiado.

Entrevistados cujas empresas já empreenderam esforços significativos de sustentabilidade afirmam que, com tais esforços, descobriram fatos sobre suas organizações e operações que os surpreenderam. E que a capacidade de fazer essas descobertas foi resultado de como a sustentabilidade os levou a ver tudo de “um ponto mais elevado”, como um deles descreveu. “Você é chamado a ver o sistema como um todo, no qual você está inserido, não apenas suas fronteiras. Somos uma empresa que estuda tudo, ou assim pensávamos. Estamos aprendendo.”

O vice-presidente da Coca-Cola, Jeff Seabright, coloca a situação desta forma: “A agenda de sustentabilidade oferece visões de dentro do negócio que talvez não fossem evidentes quando começamos essa jornada. Quando realmente começamos a rastrear onde o carbono estava na cadeia de valor, encontramos desperdício no sistema. E onde há desperdício há oportunidade”.

Outros executivos chamam esse processo de “juntar os pontos”, afirmando que é mais fácil quando se pode visualizar todo o sistema. A sustentabilidade amplia o foco e joga luz sobre como os fatos, as tendências, as observações e as ideias são relevantes uns em relação aos outros.

5. Inovação. Você pode chegar lá a partir de um ponto, mas pode chegar a partir de outros.

Os desafios da sustentabilidade demandam um tipo de inovação de desenvolvimento iterativo (repetitivo), mais paciente, que requer diversos inputs, segundo os pensadores de management entrevistados. Uma vez que os problemas de sustentabilidade são interdisciplinares, o que não é usual, a colaboração entre setores diferentes da empresa é essencial. Frequentemente promovem experimentos teóricos, que também não são habituais, durante longos períodos de tempo. Estimulam a coleta de dados e a análise de processos de formas inéditas, levando a novas percepções.

Essas características conduzem, algumas vezes de maneira acidental, a melhores resultados de inovação. “Criam diálogos diferentes, levantam questões diversas”, disse um executivo. “Revelam opiniões inesperadas que podem levar, ou não, a algo que você quer. Mas a riqueza daquela opinião não está disponível se você não participar desse jogo.”

6.Coordenação. A vantagem da rede, por necessidade.

Por causa da complexidade dos problemas de sustentabilidade e do fato de que é da natureza desses problemas permear todo o sistema, os especialistas dizem que para enfrentá-los é necessária a colaboração de quase todos os setores. O trabalho deve ser coordenado por meio de feudos internos da empresa, de setores de atividade e de regiões geográficas. As empresas devem trabalhar com os governos, ONGs, comunidades e até mesmo concorrentes.

As empresas que aderem a essa ideia, dizem os entrevistados, ganham enorme vantagem funcional em todos os aspectos do negócio, e não apenas naqueles que envolvem projetos de sustentabilidade.

“Temos observado ganhos enormes de integração e comunicação entre os silos”, disse um executivo de uma multinacional da área de tecnologia da informação. “O trabalho em relação à sustentabilidade nos forçou a aprender um modo diferente de trabalhar. E agora sabemos como fazer isso.”

7.Parceria. Acabando com o abismo da confiança.

Outro tema que aparece em quase todas as entrevistas: o medo do risco subiu às alturas; a capacidade de avaliar o risco é baixa; qualquer organização que possa inspirar confiança sai em vantagem. Especialistas preveem uma tendência forte na direção de qualquer prática de management e comportamento corporativo que possa permitir que potenciais stakeholders avaliem o risco de forma mais confiável, especialmente a prática eficaz da transparência. Eles anteveem mudanças nos indicadores e relatórios financeiros e nas estratégias de comunicação externa.

8.Vantagem. Os primeiros a se adaptar vencem.

Os entrevistados afirmam que esforços precoces rumo à sustentabilidade gerarão vantagem maior do que se costuma ver nos pioneiros. Muitos se valem, para isso, da observação de que várias empresas estão se jogando na sustentabilidade, queiram elas enfrentar essa questão ou não. Diversas vezes, esse movimento envolve dor, ainda que ela leve a ganhos no final das contas. Especialistas argumentam que as empresas mais inteligentes estão trabalhando para ultrapassar essa fase, planejando a solução para problemas antes mesmo que surjam. Eles afirmam que, quando a sustentabilidade impacta um setor de atividade, seus efeitos são mais intensos e abrangentes do que forças típicas de mudança de mercado. Estar à frente, dizem, vai fazer ainda mais diferença.