Na semana que antecedeu à premiação do Oscar, deparei com um questionamento estranho na minha mente: como era mesmo a antiga rotina de ir ao cinema? Demorei a recordar que costumava ir às terças-feiras e que a decisão estava relacionada a momentos em que precisava espairecer e relaxar. Fiquei tentando reviver a sensação de estar na sala escura. Mesmo tendo passado os últimos dez anos frequentando salas de cinema com uma assiduidade bem expressiva, este último ano distante da telona teve um efeito devastador na minha capacidade de retomar a memória desse hábito.

Por causa desse pensamento, comecei a buscar ativamente outras experiências que caracterizavam minha vida antes da pandemia e que também estavam sendo abaladas. Festas em família, encontros com amigos, comemorações de todo tipo, viagens a trabalho e a lazer. Tudo parece estar mais no campo das recordações do que dos hábitos.

Esta é uma caraterística importante da forma como o cérebro funciona e que está diretamente ligada ao fenômeno que estou relatando aqui: a vida já não é mais do mesmo jeito não apenas porque o mundo fora de nós mudou, mas especificamente porque a percepção sobre a vida, os hábitos e os comportamentos mudou. Você já se pegou sentindo um verdadeiro estranhamento ao ver alguém na rua sem máscara? No início da pandemia o estranhamento estava em ver pessoas mascaradas. E o desconforto de chegar e não cumprimentar as pessoas com apertos de mão, abraços, um ou dois beijinhos? Também já está bem menos evidente?