Durante a pandemia, Henrique adquiriu o hábito de fazer reuniões andando e agora, na volta ao trabalho presencial, não consegue mais trabalhar sentado. Com seu headphone sem fio, perambula falando alto. As pessoas se incomodam, mas ele não nota, é distraído. Henrique provavelmente entenderá de um jeito doloroso, quando mais gente voltar ao escritório e rejeitá-lo, que está sendo desrespeitoso ao não se importar com quem está no entorno. E para quem pensou “ufa, não sou igual ao Henrique ”, cuidado. É possível ser pior do que ele – ser igual à Maria.

Estamos falando de Mary Mallon, que imigrou da Irlanda para os Estados Unidos em 1883 e infectou 50 pessoas de tifo, três das quais morreram. Primeiro, Mary não sabia o que estava fazendo, pois tinha a bactéria causadora da doença, mas era assintomática. Depois, quando descobriram que era o ponto comum na explosão de casos de tifo em Nova York e a avisaram, ela não obedeceu às restrições assim mesmo. Mudou de nome e voltou a circular, o que significa que voltou a infectar pessoas. O desfecho da história é triste: a irlandesa viveu 26 anos de quarentena, até o dia de sua morte. Esse caso ficou famoso inclusive no Brasil – já ouviu a expressão “Maria Tifoide”? Agora você sabe que Maria Tifoide existiu; era Mary Mallon, e seu erro foi não respeitar as outras pessoas, assim como Henrique.

Esses dois casos, ambos reais, ilustram bem o que é etiqueta e o que significa se comportar em sociedade. Não é saber usar os talheres certos para comer lagosta e caranguejo; é respeitar os outros. E requer dois movimentos simples: (1) prestar atenção ao que faz mal aos demais e (2) importar-se com isso e evitar fazê-lo. O que explica por que se fala, cada vez mais, em uma nova etiqueta pós-pandêmica. Se as pessoas ficaram diferentes, o respeito naturalmente tem de incluir as diferenças.