Em um universo paralelo, a Microsoft não seria obrigada a competir com o Slack, software de comunicação de equipes que é a grande sensação das mensagens na internet. Simplesmente o compraria.

Em março último, o site de notícias de tecnologia Tech-Crunch chegou a publicar que o vice-presidente de aplicativos e serviços da Microsoft, Qi Lu, havia proposto internamente que sua empresa adquirisse o Slack pagando até US$ 8 bilhões.

Mas, segundo o site, o presidente da MS, Satya Nadella, e o próprio Bill Gates descartaram a possibilidade. O argumento de Gates foi o de que a Microsoft deveria se concentrar em tornar o Skype, com seus serviços de voz, vídeo e mensagens, um grande rival do Slack.

É fácil entender por que Lu chegou a cobiçar o software de comunicação entre equipes, com suporte para conversas e troca de arquivos entre o pessoal do escritório. Com menos de três anos de vida, o Slack já conta com 3 milhões de usuários ativos diários. E, ainda mais importante do que isso, esses usuários gastam em média 5 horas e 20 minutos no aplicativo em cada dia da semana – período no qual poderiam estar utilizando o Outlook, da Microsoft, para enviar e-mails, por exemplo.

No entanto, também fica claro entender por que Nadella e Gates podem ter reagido friamente à proposta. A Microsoft tentou oferecer ao mercado um serviço semelhante ao Slack várias vezes. Em 2011, comprou o Skype por US$ 8,5 bilhões e, em 2012, o Yammer, outra ferramenta de colaboração entre equipes, por US$ 1,2 bilhão. Nenhuma dessas iniciativas se mostrou realmente transformadora.

Questão de produtividade

A Microsoft tem muito em jogo nessa disputa com o Slack. A empresa que inventou o pacote de softwares para aumentar a produtividade dos profissionais de escritório tem nada menos do que 1,2 bilhão de usuários do Office.

Nos últimos tempos, ela vem trabalhando para que as pessoas deixem para trás a versão “física” do Office, que compram e usam para sempre, e migrem para o Office 365, serviço pelo qual pagam mensalmente e que inclui armazenamento de arquivos em nuvem e outras vantagens para dispositivos móveis.

O Skype não precisa ser um rival para aniquilar o Slack, e é improvável que um dia consiga cumprir essa missão. Idem para o LinkedIn. O mais importante é que assegurem que o Office permaneça relevante, em uma época em que a produtividade vai muito além de um processador de texto, de planilhas e de e-mails. Essa é uma das mudanças que o software Slack está promovendo.

O que quer a Microsoft

A Microsoft delineou sua ambiciosa visão de futuro em abril, durante a Build, sua conferência anual de desenvolvedores. A empresa enxerga o Skype e o Office operando juntos para servir melhor os usuários, por meio do recurso que o setor chama de bot (diminutivo de robot) ou internet bot.

Esses pequenos pedaços de software inteligente tentam antecipar o que uma pessoa necessita e, então, realizar determinadas atividades no lugar delas. Por exemplo, se a Cortana, a assistente virtual inteligente do sistema operacional Windows 10 (semelhante à Siri, da Apple), percebe que você está discutindo uma viagem de negócios pelo Skype, ela pode agir. De maneira proativa, a Cortana consegue bloquear o horário correspondente à viagem na agenda de seu Outlook, negociar com o bot do hotel uma reserva de quarto e alertar um amigo de sua cidade de destino sobre sua provável visita.

Em outras palavras, a Microsoft quer que seus produtos contribuam para a rotina dos usuários, principalmente no que diz respeito às coisas que significam, muitas vezes, perda de tempo, liberando-os para o trabalho criativo que os softwares de automação não são capazes de resolver.

Essa visão do futuro em relação à produtividade das pessoas soa familiar para qualquer usuário do Slack. Afinal, os softwares inteligentes foram um componente-chave de todo o entusiasmo pelo aplicativo por mais de um ano. Há dúzias deles disponíveis no Slack para que as pessoas realizem tarefas cotidianas como controlar despesas e encomendar comida.

Por conta disso, a Microsoft, seguindo a tendência iniciada pelo Slack, vem lançando ferramentas para ajudar os desenvolvedores a criar bots e até abriu lojas online em que os clientes podem adquiri-los.

O Slack, por sua vez, foi além e anunciou a criação de um fundo de US$ 80 milhões para impulsionar a criação de bots e outros elementos integrados a eles que sejam capazes de alavancar sua plataforma.

Esse movimento reflete um mantra repetido pelo cofundador e presidente do Slack, Stewart Butterfield. Segundo ele, o Slack deve trabalhar com ferramentas de outras companhias, em vez de tentar substituí-las. Conceito semelhante é defendido pelo presidente da Microsoft, Satya Nadella. Talvez por isso mesmo os bots da Microsoft funcionem dentro do Slack.

Avanços recentes

O fato, porém, é que o Slack está se movimentando mais rapidamente. Em maio, anunciou o lançamento do Sign in with Slack, serviço que permite que usuários de outras ferramentas de produtividade – como o popular programa Quip, de edição de documentos – façam o login utilizando a identificação que possuem no Slack.

Essa nova possibilidade tem o potencial de fazer do Slack a forma preferida, e mais fácil, de trabalhar. O Sign in with Slack carrega a aspiração de fazer pelo aplicativo o que o Connect fez pelo Facebook: disseminar o domínio por toda a internet e tornar o Slack o Facebook da colaboração entre equipes. 

A Microsoft pode acabar concluindo que US$ 8 bilhões pela compra do Slack seria a barganha da década. No entanto, à medida que o Slack agrega atributos típicos do Skype, como voz e vídeo, deve ficar crescentemente cuidadoso em relação ao risco de acabar se transformando em um site inchado, o que os usuários odeiam.

Embora o futuro do trabalho e a busca por produtividade tendam a deixar de lado os pacotes de softwares que abrangem todo tipo de programas – formato que o Office inaugurou nos anos 1990 –, o melhor cenário para os usuários talvez seja mesmo a coexistência das duas empresas, para que seus produtos interajam de novas maneiras, permitindo que os profissionais sejam mais produtivos do que nunca.

A Microsoft tem Office, Skype, Linkedin; o Slack conta com o vício de seus usuários

O Slack ainda não possui versão em português

Com seus aplicativos web e móvel, esse software de comunicação interna, que significa “folga”, em inglês, permite criar conversas públicas e privadas (como uma rede social), trocar mensagens e arquivos de imagens e vídeos (como um programa de e-mail), compartilhar tarefas etc. Além da enorme quantidade de funcionalidades, oferece novas integrações a cada dia (é possível integrar Dropbox, Twitter, Google Docs, Asana, Trello, GitHub), e isso o tem rapidamente transformado em referência mundial para a categoria de comunicação em grupos de trabalho. Não é raro ouvir depoimentos de usuários do Slack de que ficam viciados no sistema. Tanto que, entendendo isso, a empresa publica em seu site vagas de emprego em companhias que usam o Slack. 

Não há versão do Slack em português do Brasil, mas, mesmo assim, o aplicativo é bastante usado nas startups do País.