O diretor de cinema David Fincher não é Orson Welles e o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, também não é o cidadão Charles Foster Kane, ou melhor, William Randolph Hearst, o magnata da imprensa dos anos 1940, inventor do sensacionalismo e inspirador do protagonista de Cidadão Kane. Mas a repercussão de A rede social, o filme que o diretor de O clube da luta fez sobre o Facebook, oferece, à luz do fascinante filme de Welles, uma oportunidade para analisar o poder de um bom relato (verdadeiro ou não) para moldar nossas percepções. Além disso, ressalta a vigência do velho meio cinematográfico –Hollywood– como criador de mitos, em contraposição com as novas mídias sociais e a internet. Em sua análise sobre o tema, Kendall Whitehouse, diretor de novas mídias na Wharton School, da University of Pennsylvania, sustenta que, na hora de compor grandes histórias, a prevalência de Hollywood continua inquestionável.

O filme de Fincher estreou em outubro de 2010. A obra não é exatamente uma homenagem ao bem-sucedido fundador da rede social, multimilionário aos 26 anos de idade. Trata-se, na verdade, de um jovem brilhante, porém obsessivo, petulante, imaturo e desleal, que cria uma companhia para conquistar garotas e ingressar nas universidades de elite. Em seu caminho ao topo, o protagonista também investe contra alguns amigos e sócios e deixa um rastro de demandas judiciais.

Apesar de o roteirista deixar claro que A rede social é uma autobiografia ficcional (Welles também negou que Hearst fosse Kane literalmente) e o criador do Facebook recusar a narração como real –“Só representaram bem minha maneira de vestir”, declarou ele–, na hora da estreia, a sorte de Zuckerberg estava lançada. Como uma melodia contagiante, um bom conto permanece na lembrança. “Os fatos só importam enquanto constroem uma narração coerente”, assinala Whitehouse.