Quando o furacão Katrina atingiu os Estados Unidos em 2005, muita gente se perguntou por que o país mais rico do mundo não estava mais bem preparado para uma catástrofe como aquela. No meio do turbilhão, a Cruz Vermelha norte-americana –instituição muito respeitada–teve seu trabalho questionado.


Preocupados com os comentários negativos, publicados em blogs, fóruns de discussão e sites de redes sociais, e temendo pela reputação da organização, os diretores da Cruz Vermelha decidiram contratar uma pessoa –Wendy Harman– para ser gerente de mídias sociais, com a função de tentar frear a onda de críticas. Em pouco tempo, Harman demonstrou que onde os dirigentes viam um problema existia, na verdade, uma grande oportunidade: milhares de usuários da internet, conectados diariamente e desejosos de colaborar com a instituição.

Com essa história, Charlene Li inicia o livro Liderança aberta: como as mídias sociais transformam o modo de liderarmos, trazendo à luz seu conceito-chave: os líderes devem perder o medo das novas tecnologias e atrever-se a construir um relacionamento aberto com stakeholders.

A primeira parte do livro analisa os aspectos positivos de deixar de lado o controle e traz um panorama das diferentes maneiras de ser aberto. A segunda parte ensina o leitor a determinar qual seria a estratégia de abertura mais adequada para sua organização. Na terceira e última parte, Li explora o significado da liderança no contexto dos novos relacionamentos nascidos das tecnologias sociais.

Há algo em comum entre o CEO de uma companhia que tenta utilizar tecnologias sociais para introduzir um novo produto ou responder ao descontentamento dos clientes, um gerente de RH disposto a aproveitar as ideias dos funcionários de sua empresa e um diretor de escola que trabalha com pais comprometidos e envolvidos. Todos eles estão percebendo uma mudança fundamental nos relacionamentos de poder, pela qual os indivíduos têm a capacidade de transmitir suas ideias a uma audiência ilimitada em termos de tempo e de espaço, já que se trata do mundo inteiro, sempre. Charlene Li explica em Liderança aberta que essa transformação se deve a três tendências:

  1. Tem mais gente online. Além de ser cada vez maior a quantidade de pessoas conectadas na internet, elas estão aumentando, significativamente, o tempo que passam online e os tipos de atividades que realizam.
  2. O uso dos sites sociais aumentou. As pessoas passam muito tempo conectadas e deixaram de ser simples consumidoras de conteúdos criados por outros, para se converterem em criadores de conteúdo que publicam no espaço virtual.
  3. Generalizou-se uma cultura focada no compartilhar. Os últimos anos foram especialmente dominados pela radicalização dessa mudança no uso e no consumo da informação. Compartilhar é uma atividade profundamente arraigada no comportamento humano e a cada nova revolução tecnológica aplicada às comunicações –o papel impresso, o telégrafo, a telefonia e o e-mail–, ela vem se tornando mais rápida, simples e econômica.

Li considera que o compartilhar entrou em uma nova dimensão. Há uns cinco anos, a não ser que uma pessoa soubesse programar uma página na internet, o compartilhar limitava-se à quantidade de e-mails enviados. Se alguém enviava muitos, sua credibilidade ficava em jogo.

Hoje, a distribuição generalizada de informação pela internet é tão fácil quanto atualizar o Facebook ou o Twitter e pode ser realizada a partir de quase qualquer plataforma (um navegador da internet, um celular e, em muitos casos, de uma televisão). Além disso, existem novos serviços que facilitam a publicação não só de textos, mas também de diferentes tipos de conteúdo: Flickr, para as fotografias; YouTube para os vídeos etc.

Compartilhar não é apenas simples e comum: “Esse salto tecnológico deu a toda pessoa que possui um telefone celular a capacidade de compartilhar ideias e produtos com o mundo”, destaca a autora.

A crescente adoção das tecnologias sociais tornou inevitável que os líderes, as companhias, os sócios e os investidores começassem a delegar o controle para entrar em uma nova era de abertura, na qual a informação deixou de fluir de maneira unidirecional. Os consumidores mudaram de atitude, porque agora têm um poder novo que os habilita a questionar a concepção de autoridade baseada no controle e na hierarquia.

Os consumidores foram habilitados a questionar a ideia de autoridade baseada em controle e hierarquia

Funcionários no poder, chefes amedrontados

As mídias sociais não deram um novo poder somente aos clientes; elas têm oferecido aos funcionários novas maneiras de colaborar entre si e proporcionaram outros fóruns para reclamarem publicamente de seu trabalho. Problemas que antes se resolviam em canais privados –telefonemas ou e-mails– agora se desenvolvem à vista de todos.

“Seguramente você se queixou de seu trabalho com amigos e familiares e compartilhou com eles suas frustrações trabalhistas”, diz a autora dirigindo-se ao leitor. “No passado, geralmente, o efeito dos funcionários descontentes se limitava ao círculo íntimo. Mas hoje, só de entrar em um site como glassdoor.com, a pessoa já se inteira de tudo o que acontece dentro de uma organização.” Nesse site, os funcionários examinam, de maneira anônima, as companhias e seus diretores, e informam os próprios salários e cargos, com o objetivo de ajudar aqueles que ocasionalmente estejam negociando um posto ou uma promoção. 

Os gestores, no entanto, sentem-se ameaçados pelo poder das tecnologias sociais muitas vezes, mas, ao mesmo tempo, ficam intrigados e entusiasmados com as oportunidades que essas novas ferramentas apresentam.

Nas conversas que manteve com centenas de líderes que desejavam aproveitar o poder dessas tecnologias para transformar seus negócios, Charlene Li descobriu que eles valorizavam principalmente a possibilidade de escutar em tempo real o que seus clientes diziam sobre eles. Também sentiam curiosidade a respeito de duas questões: a capacidade de obter novas ideias dos consumidores e a possibilidade de reduzir os custos de suporte por meio da colaboração entre clientes para a resolução dos problemas.

A autora chega à conclusão de que, para ter sucesso na adoção das novas tecnologias, é necessário que os líderes possuam uma mentalidade aberta e sejam capazes de deixar de lado o controle no momento adequado, na situação apropriada e na proporção correta.

“O motivo para ter um comportamento proativo no que diz respeito a delegar o controle, é que ao fazê-lo pode-se, na verdade, recuperar certa aparência de controle”, explica Li. Apesar de parecer incongruente, relacionar-se com as pessoas delegando poder é a única maneira que, atualmente, os diretores têm de influenciar os resultados.

Desse modo, chega-se a uma das ideias centrais do livro: os líderes devem entender o desafio de “deixar de lado” o controle como um passo necessário para a construção de novos tipos de vínculo. Tomando a definição de liderança de James Kouzes e Barry Posner, como o relacionamento entre quem quer conduzir e quem escolhe ser seguidor, Li propõe que, em uma época na qual os clientes e os empregados estão redefinindo, com as tecnologias sociais, a maneira como os relacionamentos são construídos e sustentados é hora de as organizações começarem a refletir a respeito do próprio relacionamento com seus empregados, clientes e sócios.

A autora também pergunta ao leitor quanto controle ele considera ter realmente no palco definido pelos relacionamentos. A esse respeito, adverte: “Você não pode fazer com que os clientes comprem seus produtos (por mais que o departamento de marketing pense o contrário), nem que seus empregados respaldem uma estratégia”. Tanto uns quanto outros têm liberdade para eleger de quem comprar um produto e qual chefe apoiar.

No site glassdoor.com, um funcionário acompanha o que acontece com determinadas empresas e executivos

Li sustenta que, na verdade, os líderes não possuem o controle e talvez nunca o tenham tido. É por isso que, para conseguirem ser abertos, têm de deixar de lado a necessidade de estar no comando. Para preencher o vazio decorrente, devem confiar que a pessoa que vai receber esse poder atuará com responsabilidade.

O novo poder das mídias sociais

É fundamental que a liderança esteja focada em uma nova mentalidade. Muitos relacionamentos de negócios seguem um modelo tradicional e ficam marcados pela falta de profundidade e de compromisso real. A autora conta que, ao pedir a muitos homens e mulheres de negócios que descrevessem a natureza de seus vínculos com os clientes, eles utilizaram adjetivos como “de curto prazo”, “transacional” e “impessoal”. Como seria se imaginássemos um novo tipo de relacionamento, construído sobre múltiplas experiências partilhadas e no qual a confiança fosse cultivada? É provável que outros adjetivos seriam usados: “leal”, “comprometida” e até “apaixonada” e “íntima”.

Esse novo tipo de vínculo já está ocorrendo, diz Li, e não só no mundo dos negócios. A autora aponta um exemplo contundente na campanha presidencial de Barack Obama, em 2008. A equipe do candidato democrata percebeu que, com um candidato que a maioria não conhecia muito, seria necessário gerar conhecimento sobre a vida pessoal dessa figura pública. Foi assim que a campanha abarcou o plano da vida pessoal de Obama, mediante a criação de uma rede social privada e o aproveitamento de sites como Facebook e MySpace. O ponto culminante foi atingido com o vídeo Yes, we can, que conseguiu a adesão de milhões e voluntários. A conclusão de Li é que a campanha de Obama fez algo mais que simplesmente empregar a tecnologia de maneira nova e hábil; utilizou-a para criar um relacionamento inclusivo que até então não existia.

5 novas regras da liderança aberta

Uma das teses centrais do livro vincula-se a uma grande mudança que estamos vivendo: as novas tecnologias permitem afrouxar o controle, mas sem deixar de estar no comando. Isso se deve às novas ferramentas de comunicação, melhores e mais baratas, que nos dão capacidade de saber o que acontece tanto com os clientes como com os funcionários. O resultado desses novos relacionamentos é o que a autora define como “liderança aberta”, que deve ser exercida com confiança, humildade e disposição para ceder o controle. Em troca, o líder inspirará às pessoas e conseguirá que trabalhem, comprometidas, no cumprimento das metas. Para compreender e dominar como funcionam esses relacionamentos e esse tipo de liderança, é necessário partir de novos princípios:

  1. Respeitar o fato de que os clientes e os empregados possuem poder. Uma vez que isso é aceito como verdade, é possível começar a ter um relacionamento mais real e igualitário entre as pessoas. Sem essa mentalidade, continua prevalecendo o pensamento de que funcionários são recursos realocáveis.
  2. Compartilhar permanentemente, para construir confiança. No coração de qualquer relacionamento vitorioso está a confiança, que surge quando se cumpre o combinado. Mas, nos ambientes cada vez mais virtuais e participativos do mundo de hoje, a confiança também surge das pequenas conversas cotidianas entre pessoas que dia a dia compartilham pensamentos, atividades e preocupações, tudo isso graças a blogs, redes sociais e Twitter (entre outras tecnologias).
  3. Alimentar a curiosidade e a humildade. Para o compartilhar atingir sua dimensão mais importante, devemos expressar nossa curiosidade e construir uma ponte entre aquilo que queremos dizer e o que o outro quer escutar. A consequência natural da curiosidade é a humildade. Ela nos proporciona a integridade intelectual, permitindo-nos reconhecer que ainda temos muito para aprender e errar. 
  4. Ser responsável pela abertura. Nos relacionamentos humanos, o ajuste de contas é um caminho de mão dupla: traduz tanto as expectativas presentes no relacionamento como as consequências de não satisfazê-las. “Qual a primeira atitude a ser tomada se um produto for alvo de reclamação?”, pergunta a autora. Pedir desculpas e encontrar uma forma de resolver o problema, seria a resposta correta. Da mesma maneira, se damos às pessoas a possibilidade de comentar em nossos sites e acontece um abuso dessa liberdade, essas pessoas deverão aceitar que terão acesso negado no futuro. 
  5. Perdoar o fracasso. Depois do ajuste de contas vem o perdão. No terreno dos relacionamentos, os desfechos com frequência são ruins, gerando rancores e culpas. Li propõe que o fracasso deva ser reconhecido e compreendido.

Compartilhar permanentemente é uma das regras da liderança aberta, porque isso é o que constrói confiança

10 elementos da abertura com controle

Depois de apresentar as oportunidades e os perigos desse novo mundo aberto, a autora aprofunda seu conceito de abertura. Ela afirma que há muitas maneiras de ser aberto e, em consequência, falta um marco básico para apoiar as discussões. Por exemplo, a Mozilla entende a abertura em função da tecnologia. Seu produto está construído com um código aberto, motivo pelo qual as melhorias do navegador Firefox podem vir de qualquer lugar. Outro caso ilustrativo é o da Ideo, firma de consultoria especializada em design e inovação, célebre por sua cultura de trabalho aberta e por conceber a abertura em função de um “pensamento de design”.

Definir a noção de abertura requer uma mudança de mentalidade, sustenta Li. Diante do fato que os líderes e suas organizações exercem um controle cada vez menor sobre a situação do negócio, o foco não deve estar nas tentativas de reter esse escasso controle restante, mas sim na tarefa de decidir onde e quando se abrir para incorporar os funcionários, clientes e sócios, agora senhores de um poder inédito.

Apesar de as pessoas em geral associarem a abertura à primeira parte da definição de liderança utilizada neste livro (a que se refere à confiança e à humildade), é a segunda parte dessa definição (a que fala de inspirar às pessoas e conseguir que trabalhem comprometidas com o cumprimento das metas) que garante a obtenção de resultados favoráveis e focados nos objetivos.

As organizações podem ser ao mesmo tempo abertas e fechadas, isso é esperado. Para que sejam abertas e, ainda assim, cumpram com suas metas, devem exercer certo controle. Mas como o líder pode compatibilizar a abertura com um gerenciamento eficiente? Não é algo fácil de resolver. Mas Charlene Li contribui com a solução desse impasse, propondo um conceito de abertura formado por dez elementos, reunidos em duas amplas categorias: o compartilhamento de informações e a tomada de decisões.

As organizações podem ser ao mesmo tempo abertas e fechadas, isso é esperado. Afinal, cumprir metas exige controle

Compartilhamento de informações. Li considera que esse é o “lubrificante” de toda organização. Na década passada, as novas tecnologias aceleraram o fluxo informativo, primeiro com a adoção generalizada do e-mail e depois com a irrupção das tecnologias sociais. Essa categoria inclui seis elementos:

  1. Explicar, para criar aceitação e compromisso.
  2. Atualizar, para gerar conhecimento.
  3. Dialogar, para melhorar as operações.
  4. Fomentar a participação.
  5. Resolver coletivamente um problema específico.
  6. Estabelecer padrões e compartilhar dados.

Tomada de decisões aberta. Esta categoria está ligada à anterior, pois os processos decisórios abertos requerem informações amplamente compartilhadas.

Charlene Li explica: “Se você vai envolver mais pessoas no processo, elas devem contar com toda a informação necessária para fundamentar suas decisões”. Do mesmo modo que o compartilhar informações, a tomada de decisões aberta varia significativamente não só entre as diferentes companhias, mas também no interior de uma mesma organização. (A decisão que é tomada em nível gerencial não será igual à que surgir da discussão de uma equipe de trabalho.)

A autora distingue quatro tipos de processo decisório como os quatro elementos adicionais da abertura, que diferem segundo o grau de controle, a amplitude das informações compartilhadas e a eleição das pessoas adequadas:

  1. Processo centralizado.
  2. Processo democrático.
  3. Processo consensual.
  4. Processo distribuído.

Na sequência, a autora convida o leitor a realizar uma auditoria para averiguar quanto sua organização é aberta em cada um dos dez elementos para descobrir em quais deles deveria avançar mais. Ao realizá-la, recomenda Li, convém não perder de vista que existem diversas maneiras de ser aberto (dentro de uma tomada de decisões centralizada, inclusive, contanto que haja compartilhamento de informações nas pontas inicial e final do processo) e que a abertura consta de duas dimensões ou categorias intimamente relacionadas, como já mencionado.

Como abrir (e os objetivos como ponto de partida)

O trabalho duro começa na parte 2 do livro, na qual são oferecidos ao leitor elementos para que desenhe sua estratégia de abertura. Ao encarar esse processo, é essencial equilibrar os benefícios e os riscos envolvidos e também ter consciência das implicações de ser aberto, como adverte a autora.

Charlene Li convida os gestores a fazer uma auditoria de abertura em sua empresa a partir da análise dos dez elementos

Charlene Li explica que, quando os líderes tentam decidir quão abertos precisarão ser, costuma faltar a eles uma estratégia aberta coerente, ou seja, objetivos estratégicos que sejam guiados pela abertura. Para deixar claro, ela indica quatro objetivos presentes na maioria dos planos estratégicos bem-sucedidos. Um ou mais desses objetivos podem justificar a abertura; todos aplicam-se tanto a situações internas como externas e estão, em um primeiro momento, destinados aos funcionários e, depois, aos clientes e sócios:

  • Aprender. É o objetivo do qual dependem os demais. As organizações e seus líderes sabem que devem aprender com seus funcionários, clientes e sócios, antes de aspirar a qualquer outra meta.
  • Dialogar. A comunicação transforma um relacionamento e uma mensagem unidirecional em um diálogo entre iguais.
  • Proporcionar apoio. Desde a pré-venda até o pós-venda, é necessário que todas as pessoas envolvidas com uma companhia estejam dispostas a oferecer ajuda aos demais.
  • Inovar. Para estimular a criatividade, por exemplo, pode-se encorajar que funcionários e clientes proponham sugestões.

Os executivos devem analisar cada um desses objetivos em função dos benefícios geradores de uma abertura maior. No caso do primeiro deles, a pergunta correta é: “Aprende-se melhor por meio de uma abertura maior?”. Se a resposta é afirmativa, o diretor encontrará uma boa razão para ser mais aberto. “Ao basear a estratégia aberta em um objetivo estratégico-chave, consentido por todos, a pessoa fica assegurada que conseguirá o respaldo executivo, financeiro e emocional, necessário para levar a cabo a difícil transição para uma abertura maior”, assinala Li.

Mas atenção: se em uma área determinada não faz sentido ser mais abertos, não há por que sê-lo. Como líderes, explica a autora, temos de focar nossa estratégia aberta em metas concretas. Se não temos um objetivo concreto para, por exemplo, criar um blog ou uma conta no Twitter, não devemos criá-la.

A autora aborda o caso da Apple para demonstrar que há organizações que não precisam implementar uma estratégia aberta e podem ser fechadas em determinados aspectos, pois contam com outros elementos para atingir o sucesso. “Dados seus objetivos estratégicos, a Apple não tem uma necessidade imperiosa de ser aberta, ao menos enquanto continuar desenvolvendo produtos de primeira linha”, argumenta. Ela emprega a expressão “fator Apple” para se referir às condições reunidas por essa companhia e que não são fáceis de encontrar: uma combinação de técnicos e designers brilhantes, com um CEO carismático, Steve Jobs, e uma marca amada por todos.

É preciso reconhecer o valor da abertura

Após chegar à conclusão de que existe uma distância entre a necessidade de ser aberto e a capacidade de sê-lo, e a fixação de metas em função dessa necessidade, o passo seguinte é compreender quais são os benefícios específicos de assumir uma estratégia de abertura e qual é o valor que está por trás de cada um dos quatro objetivos recém-analisados (aprender, dialogar, proporcionar suporte e inovar).

Porém existe um entrave às novas mídias sociais –como o Facebook, os blogs, os fóruns de discussão e o Twitter– quando se comparam seus benefícios com os gerados pelos canais de relacionamento tradicionais. Na verdade, ainda que as atividades levadas a cabo nesses sites sejam altamente mensuráveis (mesmo sendo intangíveis, por se tratar de relacionamentos sociais), não se estabeleceu um corpo aceitável de conhecimento e experiências que, ao se avaliarem essas atividades, considerem os custos e os riscos envolvidos na busca e na obtenção dos benefícios. 

A investigação realizada pela autora a leva a concluir que os objetivos impulsionados pela abertura, demarcados na cultura do compartilhamento, criam os seguintes benefícios:

  • A investigação realizada pela autora a leva a concluir que os objetivos impulsionados pela abertura, demarcados na cultura do compartilhamento, criam os seguintes benefícios:
  • Reduzem as barreiras de acesso à informação e às pessoas e melhoram e facilitam a tomada de decisões.
  • Maximizam os resultados: a informação, os serviços e os produtos compartilhados disseminam-se com maior rapidez e amplitude, requerendo menos investimentos diretos.
  • Permitem respostas instantâneas aos fatos, devido à natureza das tecnologias sociais.
  • Geram maior participação de funcionários e clientes, que chegam a comprometer “seu coração e sua alma”. Li considera que esse poderia ser o benefício mais importante, embora admita ser muito difícil quantificá-lo.

A abertura facilita e melhora a tomada de decisões e permite respostas instantâneas aos acontecimentos

A necessidade de um planejamento

As estratégias abertas não podem ser implementadas no vazio; deve haver uma base de apoio que lhes ofereça uma estrutura. Também é necessário existir um consenso entre todas as partes envolvidas (diretores, funcionários, clientes, investidores). Portanto, requer-se um planejamento que permita controlar adequadamente essa estratégia aberta, cujos benefícios já foram esclarecidos.

É comum confundir ser aberto com confiar nos outros.

Mas o que acontece quando o que consideramos correto não é o que se alinha com o pensamento dos outros ou com os objetivos da companhia? Surge o caos, sentencia a autora.

A liderança aberta exige a criação de uma estrutura, processos e uma disciplina ao redor da abertura. Desse modo as pessoas saberão o que esperar e como se comportar no novo ambiente. “Não seja tímido, siga adiante e gere as regras, envolvendo seus funcionários e seus clientes no caminho”, propõe Li ao leitor.

Para que a abertura seja integrada paulatinamente à dinâmica da empresa, é necessário estabelecer um plano de ação detalhado que sirva ao líder aberto como um mapa. É importante que tal plano inclua o seguinte:

  1. Criar perfis sociogeográficos de clientes e empregados. Se alguém quer estabelecer um relacionamento com outra pessoa, precisa de ajuda para saber algo a respeito dela. Li propõe que é necessário observar a paisagem social completa na qual nossa audiência está atuando e formular perguntas, tais como: de que sites sociais os clientes participam? Quais atividades realizam ali? Quais tópicos discutem?
  2. Identificar quando e de que maneira os grupos-alvo poderiam ser afetados pelos objetivos estratégicos associados à abertura*. *É imprescindível antecipar como serão atendidas as demandas desses grupos e quem estará a cargo de atendê-las. A autora assinala que, como acontece com a maioria dos processos de mudança, tornar-se aberto não é simples. Por isso é fundamental entender as posições e necessidades dos atores envolvidos.
  3. Determinar qual é a melhor estrutura organizacional. Um dos maiores problemas que as companhias enfrentam no processo de adoção de uma estratégia aberta é definir quem será o “dono” dela. Com base em sua experiência em consultoria 
  4. Orgânico: processo durante o qual a abertura cresce e prospera de maneira natural. Costuma desenvolver-se sem muita direção ou controle, como quando alguém diz “deveríamos fazer um blog” e faz.
  5. Centralizado: é o tipo de esforço inicial que as companhias encaram, geralmente, com o apoio de uma gerência que considera que a organização ou o departamento precisa ser mais aberto com os clientes e no que diz respeito à adoção das mídias sociais. Foi o que aconteceu com a Starbucks e a Ford.
  6. Coordenado: uma abordagem muito adequada para organizações descentralizadas, que querem criar grande sinergia e incentivar a colaboração entre diversas iniciativas. Esse é o caminho adotado, por exemplo, pela Cruz Vermelha dos Estados Unidos.

Li deixa claro que nenhuma opção é melhor que a outra. O modelo correto será aquele de acordo com os objetivos estratégicos da organização para a abertura e poderá ser modificado com o tempo, se os objetivos ou a estrutura interna da empresa mudarem.

O mapa de implementação de uma cultura aberta precisa atribuir claramente papéis e responsabilidades

4. Atribuir papéis e responsabilidades. É o passo seguinte, após a determinação do modelo organizacional a ser adotado. A autora sustenta que, na maioria das situações, existem três grandes responsabilidades: estabelecer a estratégia, criar ferramentas e conseguir que se mantenham, e comprometer-se com a comunidade.5. Desenhar a capacitação e o plano de incentivos adequados. Em tudo o que está relacionado com a abertura e as tecnologias sociais, é comum pensar em uma capacitação focada na aquisição de habilidades para o uso dessas novas ferramentas: como se conectar a uma rede social, utilizar o Twitter ou criar um blog. A maioria das companhias –um dos casos que a autora menciona é o da Humana, fornecedora norte-americana de seguros de saúde, que figura na Fortune 500– tem módulos de capacitação em mídias sociais anexados à intranet, com títulos como “Entendendo o LinkedIn em 15 minutos”.

Mas Charlene Li considera que é preferível focar um tipo de educação mais complexa e difícil de implementar: a que aponta a mudança de mentalidades e condutas. Ela explica que uma pessoa pode aprender a utilizar um site de redes sociais e não chegar a usá-lo, por não encontrar motivação suficiente. Outra pessoa, por sua vez, pode saber como se publica um blog e, mesmo assim, carecer do valor para levar isso até o fim. Como esse comportamento pode ser modificado? Li afirma que a resposta está nos incentivos de que a organização dispõe.

Um novo líder para uma nova estratégia

A última parte do livro é dedicada à análise do que implica ser um líder no contexto dos novos relacionamentos de poder habilitados pelas mídias sociais. A autora reitera que a presença de clientes e empregados donos de um novo poder é um fator-chave, que impõe a necessidade de uma mudança de mentalidade nos líderes. Completa dizendo que existem também fatores sistêmicos que impulsionam essa mudança, como é o caso da recente recessão econômica, que provocou acentuada queda da confiança e forçou os líderes das empresas a estabelecer seus compromissos com a busca de maior transparência operativa e financeira.

No entanto, Li constatou que muitos executivos se negam a aceitar que devem mudar. Eles acham que em tempos de crise deve-se consolidar e fortalecer uma liderança de estilo tradicional, baseada no comando e no controle, para a qual a abertura –entendida nesse livro como informação e tomada de decisões partilhadas– sempre será limitada. Para esse tipo de líderes a autora deseja sorte, pois vão precisar de muita, segundo ela.

A adoção disciplinada da estratégia aberta é a ideal: nela, o líder cede poder, mas não sua capacidade de estar no comando

Uma das principais razões de a liderança aberta ser temida e evitada é a possibilidade de perder toda aparência de controle. Charlene Li deixa claro que ela é partidária da adoção disciplinada da estratégia aberta, pela qual o líder cede poder, mas não sua capacidade de estar no comando.

Para a autora, hoje, muitos executivos estão dizendo o seguinte: “Sou responsável, portanto tenho que ter o controle. Mas se vocês me pedem que seja aberto e renuncie ao controle, qual será minha função?”. Esse é o ponto principal da questão, segundo Li, que completa: “Esses novos relacionamentos estão forçando o líder a repensar sua forma de liderar e de conseguir que as pessoas o sigam”.

Em outras palavras, não é possível ter uma estratégia coerente para impulsionar a transição para uma cultura organizacional aberta. Também são necessários líderes abertos que a executem, e devem ser dotados de nova mentalidade e de outras habilidades.

O líder não só tem de ser um bom comunicador, deve sentir-se confortável compartilhando visões e sentimentos pessoais e cultivando relacionamentos estreitos e duradouros. Os comentários negativos recebidos não podem continuar sendo evitados ou ignorados. Os diretores devem começar a aceitar cada encontro nascido da abertura como uma oportunidade para aprender, sublinha a autora.

Qualidades dos líderes abertos

Mais adiante, Li convida o leitor a refletir a respeito do significado profundo da boa liderança. Como alguém se transforma em um bom líder aberto? Há duas habilidades que devem ser desenvolvidas: a autenticidade e a transparência.

Ser autêntico significa manter-se fiel a seus valores e focar o que deseja conseguir. Para desenvolver autenticidade, a autora recomenda começar pelas pequenas ações. Assim o fez o diretor de marketing da Best Buy, Barry Judge, quando sua equipe comentou sobre as “incríveis” vantagens de criar um blog próprio, incluindo a possibilidade de iniciar um vínculo direto com os compradores. Judge sentiu-se aterrorizado enquanto escrevia o primeiro post do blog. Mas, depois que publicou as duas primeiras frases, que marcaram sua entrada no universo das redes sociais, sentiu grande alívio. “Para dar o mergulho, é necessário, simplesmente, animar-se”, revelou Judge à autora. “É preciso aprender o que deve ser feito e entender quais são as vantagens que podem ser obtidas disso.”

A experiência de Judge, ao tomar contato pela primeira vez com as tecnologias sociais, é parecida com a de muitas outras pessoas. Todas descobrem que, uma vez superado o medo e acionado o botão “publicar”, encontraram uma maneira diferente de desenvolver sua voz.

A outra habilidade que os líderes abertos devem cultivar é a transparência. Assim como a autenticidade, essa não é definida pelo líder, mas sim pelas pessoas cuja confiança ele tenta ganhar. Trata-se de levar a informação e os processos a um plano de “visibilidade”, define Li. “Tornar visíveis os objetivos e também os desafios, as ameaças e as oportunidades.” Por outro lado, a transparência significa que haverá momentos –como os que se atravessam no período de negociações– quando não será prudente compartilhar informação. Mas é fundamental que nessas circunstâncias o líder explicite os motivos pelos quais não podem oferecer detalhes.

Outra ideia em que Charlene Li insiste é que o líder aberto deve ser um catalisador que inspire os demais a trabalhar em conjunto para atingir as metas. “Ser um catalisador é um desafio, porque se trata de pedir a um grupo de indivíduos que faça as coisas de uma maneira diferente da que foi feita no passado”, explica. Os líderes abertos e catalisadores podem criar um ambiente no qual prevaleça a abertura, os objetivos se comuniquem e os indivíduos se vejam incentivados a se converter, cada um deles, em líder aberto; tudo isso no contexto de uma cultura que estimule a inovação e os riscos sejam assumidos.

A autora apresenta com clareza as diferenças entre a liderança tradicional e a aberta, destacando que no primeiro caso falamos de um papel estático, enquanto no segundo aludimos a uma pessoa que transforma.

Li refere-se, a seguir, ao valor de saber manejar os fracassos. Assegura que tão importante quanto planejar a maneira de “fracassar bem” é planejar a forma de atingir o sucesso. “A realidade do negócio é que em alguns momentos fracassaremos”, lembra, acrescentando que a capacidade de liderar se mede melhor em tempos difíceis (quando uma companhia tenta se recuperar de um grande fracasso, por exemplo) que em épocas de abundância. A isso soma-se o fato de que em uma organização aberta os fracassos estão à vista de todos. A autora analisa aqui Cisco, Facebook, Google, Kodak e Microsoft, que souberam tirar vantagem de seus fracassos.


A abertura transforma

Já no final do livro, Li se coloca no lugar daqueles diretores que têm em mente adotar uma estratégia aberta. Volta a mencionar que são muitos os obstáculos que se interpõem em processos como esses, que passam por uma mudança de valores e de rituais enraizados na cultura corporativa, e chama a atenção para o fato de que são os próprios líderes que estabelecem os valores nas organizações, quando recompensam certas ações e castigam outras. 

Portanto, se um líder não encontra valor na abertura ou vê ali um risco que supera o benefício, a empresa continuará sendo fechada, apesar das pressões exercidas pelas demais diretorias ou pela concorrência.

Para que uma organização atinja as metas vinculadas à abertura, é imprescindível que sua cultura evolua e se transforme. Foi o que aconteceu com a P&G e com o Banco Estatal da Índia, empresas orientadas, durante longos anos, para uma adesão inalterável a suas crenças corporativas.

É necessário gerar a sensação, na organização, de que é urgente e importante começar a compartilhar informações

As recomendações de Li para gerenciar uma mudança organizacional e cultural são as seguintes:

  • Gerar a sensação de que é urgente e importante começar a compartilhar informações.
  • Identificar os valores nos quais se baseará a nova cultura e utilizar as tecnologias sociais para mostrar compromisso e conexão entre eles.
  • Guiar com exemplos, para ganhar credibilidade na nova cultura e deixar à vista as atitudes que serão bem recebidas e recompensadas.
  • Incentivar a assunção de riscos.
  • Começar com objetivos pequenos, mas visando grandes ganhos, de modo a gerar confiança no processo de mudança para depois acelerar o ritmo da transição.
  • Institucionalizar sistemas e estruturas, pois os processos, os procedimentos e as pautas facilitam a mudança e fazem parte da rotina.
  • Ser paciente, já que, além da urgência de instalar a transformação, é necessário guiar a mudança em seus primeiros passos, que são os mais lentos.

Autoridade 2.0

Em um mundo no qual as comunicações se redefiniram a partir das novas tecnologias, os líderes devem repensar os fundamentos de sua autoridade. A liderança tem a ver com os relacionamentos entre as pessoas, e hoje as mídias sociais invadiram esses vínculos para transformá-los, esse é um processo que não tem volta. Charlene Li é, a esse respeito, categórica: “Deixe de se preocupar com tecnologia e concentre-se no que verdadeiramente importa: os relacionamentos”, aconselha ao leitor.

Construir ligações estreitas, leais e constantes; começar a abrir mão do poder –embora sem perder totalmente o controle; e aprender a lidar com os riscos e os fracassos. Essa é a mensagem mais profunda de um livro pensado para acompanhar os líderes na transição para uma nova maneira de entender os relacionamentos sociais, em geral, e os negócios, em particular.

Aproveitar as mídias sociais não significa nos converter em especialistas no último lançamento tecnológico para redes sociais, mas sim ter uma ideia clara de qual vínculo queremos construir com os demais. Adotar uma estratégia aberta requer convicção, disciplina e humildade. A luta para manter o equilíbrio entre abertura e controle não é nova; ao contrário, constitui um problema humano que se arrasta desde sempre, afirma a autora. 

Assim como as crianças crescem e desenvolvem uma voz própria que precisa ser escutada, os clientes, os empregados e os sócios de uma companhia também precisam ser ouvidos”, é a frase que resume a proposta de Li.