Em meio a uma nova rodada de turbulências, muitos se perguntam por que o Brasil ainda não deu certo. Estaria o país eternamente condenado a sofrer com altos e baixos na política e economia? A resposta não é tão simples. Isso porque, para responder esta questão, precisamos ir muito além da teoria econômica tradicional e do binômio político esquerda e direita que ainda prevalece nas leituras de cenário.

O mundo real é complexo, cheio de interdependências, difíceis de se detectar, em que as partes se transformam, interferem, cooperam e competem entre si. Esses sistemas complexos criados pelo homem tendem a desenvolver cascatas e cadeias descontroladas de reações que diminuem e eliminam a previsibilidade, além de gerarem superdimensionamento dos acontecimentos.

Exatamente por esta razão, este é o momento de recorrermos as contribuições da nova ciência das redes complexas e o trabalho do filósofo Nassim Taleb, autor do conceito da antifragilidade. Somente levando em consideração este repertório é possível classificar as economias em frágeis e antifrágeis, sendo o segundo grupo não apenas resistente a choques e momentos de incerteza (robusto), mas também se beneficiando e se tornando ainda mais forte diante do caos, o inverso do frágil que sempre colapsa em meio a desordem.

No atual contexto, considero que aplicar fórmulas e assim esperar prever o futuro é um atalho direto a um território de turbulências. O que não quer dizer que é preciso ficar inerte aos efeitos do tempo. É possível e, diria, essencial conseguir identificar e lidar com o que fragiliza as economias e atuar para reverter isso.

Quer compreender o que fragiliza uma economia? Veja os cinco pontos principais a levar em consideração para começar a identificar uma Economia Frágil:

1- A centralização

Qualquer forma de centralização, seja na natureza ou em processos criados pelo homem, é frágil. Um ponto central transmite erros para todo o sistema, assim como sua remoção implica na quebra de toda rede. Já um sistema descentralizado tende a se fortalecer com os erros localizados que não comprometem o todo e se tornam cada vez mais fortes.

O sistema político da Suíça é um bom exemplo de sistema descentralizado, em que as regiões são autônomas, as decisões mais participativas e pertencentes as comunidades locais. Você sabe quem é o atual presidente da Suíça? Ou conhece os políticos por lá? Se não sabe, não se preocupe, este justamente é o ponto a favor deste sistema.

2- Intervencionismo ingênuo

A medicina apresenta o conceito de iatrogenia, uma situação em que os efeitos colaterais de determinado tratamento excedem os próprios danos da doença. E é exatamente isso, a iatrogenia que o intervencionismo ingênuo provoca no mundo real. De posse cada vez mais de informações, o interventor acredita que conhece as relações de causa e efeito em um mundo complexo e com isso está apto a “consertar” o que julga estar errado.

Na Hong Kong dos anos 60, o secretário das finanças Sir. John James Cowperthwaite caminhou na direção oposta do Intervencionismo, ações que surtiram efeitos rapidamente. Durante o período, sem políticas corretivas por parte do Governo Britânico, a população que vivia na pobreza extrema caiu de 50 para 15% e os salários reais subiram 50%. Atualmente, Hong Kong tem um dos maiores PIB per capita do planeta.

3- Dívida

Toda dívida é frágil, seja de Governos, empresas ou famílias. O endividamento remove qualquer margem de manobra e redundância, tornando o devedor um alvo fácil dos membros da família da desordem. Ele se torna uma espécie de escravo, vulnerável a imprevistos e mudanças de rotas. O contrário é verdadeiro, quem tem recursos em meio a desordem se torna o maior beneficiário das oportunidades que surgem nestes momentos.

4- Estrutura produtiva de baixa complexidade 

Produzir castanhas de caju ou chips de computador, soja ou carros, bananas ou computadores, faz toda diferença. A capacidade de uma economia produzir bens e serviços demonstra o estoque de conhecimento e know-how daquela sociedade. As economias frágeis se concentram na produção de produtos básicos, com baixa complexidade, enquanto as antifrágeis tem uma estrutura produtiva diversificada e capaz de se adaptar rapidamente a qualquer nova necessidade. Quanto maior o conhecimento e know-how acumulado por uma sociedade, maior a facilidade de se desenvolver novos produtos e serviços e melhores os postos de trabalho criados.

5- Falta de pele em risco

A noção da pele em risco, em inglês Skin in the Game, se refere a ética em que as pessoas assumem tantos as vantagens quanto as desvantagens pelos seus atos. Justamente em economias frágeis há setores e grupos protegidos que não são responsabilizados por suas ações, ficando apenas com as vantagens, e assim tomam decisões com base na pele dos outros em risco. Isso causa uma transferência de riscos e desvantagens para todos, no sentido de que a sociedade paga a conta por decisões de pequenos grupos, que literalmente não estão com a própria pele em risco. A ética da pele em risco torna as decisões na sociedade mais responsáveis.

Mas retomando a questão inicial, por que o Brasil ainda não deu certo? Justamente porque precisamos reverter o quanto antes estes cinco pontos: descentralizar o poder, reduzir o intervencionismo ingênuo e a dívida, diversificar a nossa estrutura produtiva e abraçar a ética da pele em risco, tornando a Economia Antifrágil. Enquanto isso não se materializar, sofreremos sempre que formos visitados pelos membros da família da desordem.