Claudio Luiz Zaffari, diretor da área de expansão do Grupo Zaffari, é low profile. Diz somente o necessário, e só sobre projetos já consolidados ou em execução.

A mercearia em Erechim (RS), inaugurada em 1935 pela matriarca Santina, que hoje tem 101 anos
A mercearia em Erechim (RS), inaugurada em 1935 pela matriarca Santina, que hoje tem 101 anos

A discrição é uma característica da família descendente de imigrantes italianos. Fundado em 1935 por Santina de Carli e Francisco José Zaffari, seu negócio começou como um armazém de secos e molhados instalado na residência do casal, na zona rural de Erechim, região norte do Rio Grande do Sul. Então, a mercearia virou mercado. Depois, o casal tentou a sorte em transportes, combustíveis, destilarias. Levou três décadas até que saísse do interior para começar a se destacar como um dos maiores grupos empresariais do Sul do Brasil.

Atualmente, o Zaffari administra sete shopping centers e 35 super e hipermercados, quase todos em território gaúcho. As exceções ficam por conta de dois supermercados e de um shopping instalados na cidade de São Paulo. Além de operar na área supermercadista, o grupo atua nos segmentos de cartões de crédito, agronegócios e imobiliário. No total, são sete frentes, que, somadas, empregam aproximadamente 12 mil pessoas. No comando das operações estão os irmãos Airton, Ivo e Claudio, três dos 12 filhos de Santina e Francisco José. Aos 101 anos de idade, a matriarca ocupa o posto de diretora-superintendente emérita da holding Frazari, controladora do grupo. No entanto, o único porta-voz é Claudio Luiz, primo dos herdeiros.

A divisão de supermercados é o carro-chefe e chama especialmente a atenção: enquanto o setor encolheu 3,1% em 2016, segundo o IBGE, a receita bruta do Zaffari cresceu quase 10%, para R$ 4,9 bilhões. E promete não parar por aí, já que as projeções apontam para uma nova alta nas vendas em 2017, agora entre 6% e 7%.

Sabe-se que, em momentos de recessão, o consumidor dispensa o supérfluo, mas ainda compra o essencial no supermercado, como explica Marcela Kawauti, economista-chefe do SPC Brasil. Só que outros supermercadistas recuaram, como o Walmart Brasil, que registrou queda de 4,1% nas vendas líquidas em 2016 e teve de encerrar as operações de pelo menos 60 lojas consideradas de “baixa performance”, entre as quais unidades com as bandeiras BIG, Mercadorama e Nacional.

O Zaffari, não. Em 2015 (último ano com o balanço detalhado), seu lucro líquido foi de R$ 483,9 milhões, valor 6,1% superior ao do ano anterior. Além disso, o grupo é líder em faturamento por metro quadrado, de acordo com o ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), destaque absoluto no quesito eficiência.

O que leva o Zaffari a ser, de longe, a grande rede mais rentável de seu segmento? Segundo especialistas, não há só um motivo para esse sucesso, e sim quatro. Eles têm a ver com a localização, o que vale para todo varejista, assim como com o layout das unidades e a qualidade do atendimento e dos produtos. “A gente vê a preocupação em priorizar o cliente no discurso de muitas marcas, mas na prática existe uma clara dificuldade de aplicação, o que não parece ser o caso do Zaffari”, explica Alexandre van Beeck, sócio-diretor da consultoria GS&Consult.

O cliente é rei (MESMO)

Em seus primórdios, o empório familiar primava pelo atendimento, fundamentado em valores como fé religiosa, amor ao trabalho e união, e pela variedade dos produtos. Foi assim que os Zaffari ganharam a confiança dos consumidores quando chegaram a Porto Alegre, na década de 1960, ao implementar a primeira loja de varejo de autosserviço da capital gaúcha.

O grupo quebrou o paradigma das tradicionais mercearias, onde o vendedor acompanhava o cliente durante a compra, e jamais parou de crescer, chegando à posição de sexto maior supermercadista do País. Detalhe: é o único com capital 100% nacional.

Basta visitar uma das lojas para comprovar que a excelência no atendimento é prioridade. As gôndolas estão sempre abastecidas, as prateleiras são organizadas e o mix de produtos permite uma ampla grade de preços. Os funcionários são cordiais e estão bem-vestidos; os corredores, limpos; a temperatura é regulada, e a música ambiente, agradável. As filas do caixa sempre fluem com rapidez e há empacotadores à disposição para organizar as compras e carregar as sacolas até o carro. “O acolhimento faz parte de nossa cultura”, pondera Claudio Luiz.

Esse laço com o consumidor é reforçado por algo que transcende a experiência de compra. Em seu branding, o Zaffari adota um discurso pautado por uma construção de marca que, em vez de apenas vender, cativa o consumidor. Suas redes sociais funcionam, de verdade, como canais de diálogo com os clientes e, ao mesmo tempo, permitem mensurar a satisfação, as preferências e as eventuais reclamações. Nos comerciais de TV, nada de peças cheias de promoções: a ideia é tocar fundo, contando histórias inspiradoras que emocionam ao celebrar o amor, a família e a vida – valores que atravessam a história dos Zaffari.

O slogan das campanhas, “Economizar é comprar bem”, transmite a mensagem de que qualidade é mais importante do que comandar uma máquina de descontos. Para o Zaffari, não se trata de competir por preço, e sim pela experiência de compra. “Empresas que planejam grandes estratégias pecam quando não planejam pensando no cliente. O Zaffari pensa”, salienta Manoel Araújo, da consultoria de varejo Martinez de Araújo.

Quando chegou a São Paulo, em 2008, a marca precisou ganhar um acento agudo no primeiro “a” – Záffari; os paulistanos pronunciavam “safári”; na foto, a loja do Morumbi Town
Quando chegou a São Paulo, em 2008, a marca precisou ganhar um acento agudo no primeiro “a” – Záffari; os paulistanos pronunciavam “safári”; na foto, a loja do Morumbi Town

O layout das lojas é outro fator que fortalece o posicionamento do grupo. Enquanto a arquitetura dá ares de vanguarda aos shoppings, a mobília rústica dos supermercados faz referência aos antigos empórios. O logotipo leva a figura de um toldo, remetendo a uma ideia cada vez mais distante de quem frequenta os grandes supermercados: uma feira de frutas, legumes e verduras viçosas. Já o esquilo vermelho, gimmick da marca, simboliza a inteligência, a organização e a qualidade – afinal de contas, o animal é conhecido por escolher alimentos sempre frescos.

Governança familiar

Recentemente, a consultoria KPMG concluiu um estudo revelando que, no Brasil, a maioria das empresas familiares não tem planos de contratar um CEO externo. No Zaffari não é diferente. Ao longo de oito décadas, o grupo sempre foi conduzido pelos descendentes dos fundadores. “Criamos uma maneira própria de conduzir os negócios. É uma forma orgânica e sustentável, sem grandes saltos, aquisições ou fusões, com expectativa de perenidade”, explica Claudio Luiz.

Para o executivo, que tem 62 anos e trabalha no Zaffari há 46, a governança familiar é um dos diferenciais da organização. Por outro lado, faz questão de salientar que essa realidade torna indispensável a adoção de uma postura extremamente profissional. “Ser familiar não quer dizer que não conduziremos bem o negócio. Por isso, montamos tudo com sistema de gestão SAP, com posições de auditoria e trabalhos internos e escolas de treinamento.”

Os investimentos de longo prazo são outra peculiaridade do Zaffari. Atenta às oportunidades, a empresa chega a comprar terrenos em áreas de grande fluxo e, depois, os deixa em stand-by, até que seja decidido o que fazer com eles. A prática reforça sua fama de grande “banco de terrenos”. Rumores de mercado dão conta de que o grupo teria 22 imóveis em São Paulo, a maioria no entorno do Bourbon Shopping, além de um terreno de 175 mil metros quadrados na Vila Alpina, zona leste, e outro de 36 mil metros quadrados na zona sul, em frente à sede da Rede Globo. 

Bourbon Shopping, “embaixada” do Grupo Zaffari em São Paulo
Bourbon Shopping, “embaixada” do Grupo Zaffari em São Paulo

Ainda que alguns especialistas em varejo especulem a possibilidade de o Zaffari se desfazer de seu braço de supermercados, o ritmo de expansão leva a crer que essa realidade esteja distante. Nos primeiros meses de 2017, por exemplo, o grupo inaugurou uma nova unidade em Porto Alegre, a um custo de R$ 90 milhões, e já prepara a abertura de sua 36ª loja, a de Canoas, até o fim deste ano.

Frentes múltiplas

Desde os anos 1990, o Grupo Zaffari vivencia as mudanças estruturais do setor varejista. Foi assim que nasceu a Divisão Bourbon, fortalecendo o conceito de hipermercado como âncora de um shopping center. Foi ao longo dos anos 1990, também, que a marca criou a bandeira própria de cartões e levou a cabo o conceito de serviço aliado à conveniência, abrigando lanchonetes, farmácias e lavanderias em seus supermercados. 

Em 2012, a diversificação das operações ganhou um novo capítulo quando o Zaffari comprou do empresário Jorge Gerdau Johannpeter uma participação no fundo imobiliário Páteo Moinhos de Vento. O fundo é dono do edifício onde estão instalados o Shopping Moinhos e o Sheraton Porto Alegre Hotel. Por meio desse negócio, o grupo pretende lançar, ainda em 2017, um hub de saúde na capital gaúcha, com centro clínico, salas comerciais, torre residencial, centro comercial e o 37º supermercado. “Esse mix de minishopping de bairro com serviços e complexo residencial deve ser a nova tendência de investimento do Zaffari”, analisa Gildo Sibemberg, professor da ESPM-Sul e consultor de varejo da Just Retail.

Fatos e números do Grupo Zaffari

  • Hoje, o grupo emprega 12 mil pessoas
  • A divisão supermercadista faturou R$ 4,9 bi em 2016

- Até o fim de 2017, o Zaffari pode ter até 37 super hipermercados no RS e SP

O Grupo Zaffari é formado por 7 empresas:

1 -  Cia. Zaffari Comércio e Indústria

2 - Bourbon Administração, Comércio e Empreendimentos

3 - Bourbon Administradora de Cartões de Crédito

4 - Frazari Agropastoril

5 - Frazari Administração e Participações 

6 - Zaffari Trading e Participações

7 - Maxion Empreendimentos Imobiliários

A Comercial Zaffari, também dona de supermercados e shopping center, e com receita anual de R$ 382 milhões, pertence a um primo em segundo grau dos gestores do Grupo Zaffari.

O primeiro negócio da família surgiu em 1935, com a abertura de um armazém em Erechim (RS)