Temos visto proliferarem os investimentos de private equity em empresas familiares brasileiras. Ao longo dos últimos dois ou três anos, tivemos mais de 40 transações envolvendo capital de risco em companhias controladas por famílias.

A Lojas Avenida, a MRV Log e o Decolar.com são exemplos de companhias que atraíram investidores financeiros, compradores de posições minoritárias para estimular o crescimento dessas organizações ao proporcionarem alguma liquidez aos acionistas.

Esse é um fenômeno relativamente novo no Brasil, que não deve recuar em face da crise econômica atual, e resulta de uma série de fatores. Em primeiro lugar, muitos investidores de private equity internacionais já estabeleceram presença no País, e a maioria já veio com a tradição de fazer investimentos minoritários em empresas familiares com potencial de crescimento atraente.

Em segundo lugar, as companhias pertencentes a famílias estão reconhecendo que, para equilibrarem demandas crescentes por capital – para terem crescimento, liquidez e manutenção do controle –, precisam considerar fontes externas de recursos.

O terceiro motivo é que o private equity costuma ser a opção preferida para a obtenção de capital externo quando a empresa ainda não é grande o suficiente para abrir o capital em bolsa de valores.

Em suma, acionistas controladores de empresas familiares estão aprendendo que precisam obter capital externamente. Mas eles também querem manter seu controle sobre o negócio, e esses dois objetivos – crescimento e liquidez de um lado, manutenção do controle de outro – concorrem entre si.

As empresas podem alcançar o equilíbrio correto entre tais objetivos? Como? Sim, elas podem, com uma abordagem estratégica.


Abandonar o que não funciona

Em primeiro lugar, as companhias devem entender que as quatro estratégias de capital que comumente usam não tendem a proporcionar equilíbrio.

  1. Ênfase excessiva em liquidez para os acionistas. O resultado disso costuma ser nenhum crescimento e queda do valor da empresa.
  2. Ênfase excessiva em investir para crescer. Os acionistas sentem-se pressionados por dinheiro. Os líderes têm dificuldade em manter o apoio e a coesão dos acionistas, que eventualmente retirarão seu capital.
  3. Ênfase excessiva no controle total do capital. Outras empresas que abrirem mão de algum controle e buscarem capital externo poderão crescer mais que a sua e tirá-la dos negócios.
  4. Ênfase excessiva no uso de capital externo. A família perde o controle da empresa. Se esse controle for visto como agregador de valor à companhia (um diferencial competitivo), o valor total da participação da família poderá declinar também.

Essas estratégias – e suas consequências indesejáveis – devem, portanto, ser ativamente evitadas.

Tratar o capital conforme as fases

O segredo para o sucesso nessa área está em lidar estrategicamente com a necessidade de aumento de capital, conforme a empresa familiar se desenvolve pelas fases da propriedade.

Nos primórdios da companhia. O fundador tende a reinvestir quase todo o seu capital na empresa. Seu objetivo principal é o crescimento dos negócios, e isso significa reinvestimento contínuo dos lucros. Muito pouco capital é distribuído aos proprietários, seja como dividendos a acionistas, seja remunerando o trabalho de membros da família. A companhia é gerida mais informalmente, e as finanças da família às vezes se misturam com as da empresa.

Não há espaço para capital externo nessa fase. Na sociedade entre irmãos. Ainda há relativamente poucos donos, e a empresa torna-se mais sólida e rentável. Geralmente, produz lucros suficientes para satisfazer as demandas de reinvestimento, bem como de dividendos aos irmãos.

Como pode acontecer de alguns deles não trabalharem na companhia, aumenta a preocupação em separar as finanças da família das da organização.

Em nossa experiência, a necessidade de capital externo pode então surgir se uma de duas coisas ocorrer: se um dos irmãos decidir sair da sociedade ou se existir necessidade de crescimento rápido da empresa, em razão de ameaças do ambiente competitivo.

No consórcio de primos. É no terceiro estágio da empresa familiar que começamos a ver muitas outras demandas de capital concorrentes. Rapidamente, o sistema torna-se muito mais complexo, por três razões:

• As famílias crescem mais depressa do que a empresa, e esse é o estágio em que o crescimento em número de primos, e suas respectivas famílias, costuma superar o ritmo do crescimento dos lucros.

• Cada geração quer viver melhor que a anterior e, então, cada uma adota um estilo de vida mais caro que o da precedente. Ainda que o objetivo seja manter o mesmo estilo de vida, mais capital é requerido por pessoa.

• É provável que um ou mais primos não estejam engajados nos negócios familiares e prefiram aumentar seu acesso à liquidez. Assim, capital financeiro é necessário para comprar a parte desses acionistas.

Ao mesmo tempo que a demanda dos proprietários aumenta, a empresa em si começa a enfrentar novos desafios financeiros – por exemplo, por conta do amadurecimento de seu setor de atividade, quando as margens de lucro diminuem e há consolidação, o que pode reduzir a lucratividade e impor, não raro, exigências adicionais de capital (para aquisição).

Independentemente da fase, as companhias têm de se reinventar de tempos em tempos, o que também tende a consumir capital. Como o ritmo da mudança foi acelerado nos últimos tempos, vemos, cada vez mais, donos de empresas familiares forçados a levantar capital externo antes do que pretendiam.

Política financeira clara

Identificamos que o desenvolvimento de uma política financeira bem definida é um passo importante no tratamento dedicado às necessidades de capital de uma empresa familiar, necessidades essas que, como vimos, certamente aumentam com o tempo.

Uma política financeira clara não apenas equilibra objetivos concorrentes, como mantém o grupo acionista preparado para avaliar o capital externo sempre que isso se fizer necessário.

O que é uma política financeira bem definida nesse caso? Deve ser composta por cinco elementos, dos quais os três primeiros podem ser estabelecidos pelos líderes do negócio:

  1. Transparência.
  2. Critérios de investimento.
  3. Estrutura de capital (“Quanto endividamento estamos dispostos a assumir?”).
  4. Distribuição a acionistas (dividendos e recompra).
  5. Abordagem a sócios externos.

Desenvolver e manter uma política financeira clara, que inclua os elementos-chave aqui descritos, não é tarefa fácil e requer conhecimento financeiro.

Embora não seja fácil, tem muitos benefícios, pois ajuda a desmistificar o papel do capital e cria uma linguagem comum para que os acionistas discutam a respeito. Vale a pena para os acionistas da família.

Receita secreta
Deve-se tratar a necessidade de aumento de capital e equilibrar sua distribuição conforme a fase do ciclo de propriedade do negócio

Famílias recomendam

Empresas que já usaram private equity dão 6 dicas para quem quer buscar esse recurso

1- Não espere até precisar do capital. Prepare-se com antecedência. 

2- Conheça bem o perfil do investidor. Faça sua própria pesquisa e desenvolva um relacionamento com ele antes de fechar a transação.

3- Construa e mantenha o relacionamento entre as partes (família e investidor). As culturas e as linguagens podem ser bem diferentes, mas o relacionamento é chave.

4- Esclareça as implicações do investimento sobre a governança. Não se pode tirar a agilidade da empresa.

5- Reconheça que, embora a participação do investidor possa ser passageira, os objetivos dele e seus têm de ser compatíveis no período do investimento.

6- Evite condições de saída excessivamente onerosas, como a opção de venda de ações (put option, que dá ao titular o direito de venda do ativo a um preço preestabelecido, em dado período ou em data definida).

Investimentos de PE no Brasil