Exatos 20 anos atrás, um precursor do sistema de inteligência artificial (IA) da IBM Watson, o Deep Blue, derrotou o grande mestre e campeão de xadrez Garry Kasparov em uma histórica partida de homem contra máquina. Kasparov percebeu que poderia ter jogado melhor contra o Deep Blue se tivesse o mesmo acesso imediato ao enorme banco de dados de seu adversário, com toda a sua movimentação de peças anterior no tabuleiro de xadrez.

Se era justo que essa ferramenta de banco de dados fosse usada por uma inteligência artificial, por que não seria para um ser humano? Por que não ampliar o cérebro humano da mesma forma que o Deep Blue foi aperfeiçoado? Seguindo essa ideia, Kasparov desbravou o conceito segundo o qual a inteligência artificial soma forças com enxadristas humanos em vez de competir contra eles, dando origem à modalidade de xadrez avançado. Nela, disputam humanos, IAs e “centauros” – um enxadrista centauro é um ser humano que tem acesso às sugestões da IA, mas pode ignorá-las, assim como um motorista usa o sistema de navegação GPS no carro, mas nem sempre o segue.

No campeonato Freestyle Battle de 2014, aberto a todas as modalidades de jogo, a inteligência artificial pura venceu 42 partidas, e os centauros, 53. Hoje, o melhor enxadrista vivo é um centauro que atende pelo nome Intagrand – na verdade, trata-se de uma equipe composta de seres humanos e vários programas de xadrez. Os centauros são um desdobramento surpreendente do advento da IA, porém surpresa ainda maior é que os enxadristas puramente humanos se multiplicam e seu nível não para de avançar. Desde que o Deep Blue derrotou Kasparov, o número de grandes mestres dobrou. O enxadrista que hoje encabeça o ranking mundial, Magnus Carlsen, foi treinado com inteligências artificiais e é considerado, entre todos os jogadores humanos, o que mais se assemelha a um computador. Carlsen também atingiu o melhor rating entre os grandes mestres de todos os tempos.