Já há algum consenso de que os livros de história do futuro irão se referir a 2020 e 2021 como um novo “ano zero”, separando o “antes” e o “depois” da grande pandemia. Com sorte, o mesmo pode acontecer com a 26ª Conferência do Clima da ONU (COP26), ou o Acordo de Glasgow. Isso porque pandemia e COP26, somadas, podem alavancar um nível inédito de consciência dos problemas que a humanidade causa e de respostas a eles.

“Precisamos demonstrar ação e ambição nesta COP26”, disse Daniela Lerario, líder Brasil na COP26 poucos dias antes de embarcar para a Escócia. As ações descentralizadas dão esperanças. “Há muitos sinais fortes acontecendo mundialmente, inclusive no Brasil, mesmo sem considerar o governo federal. Estou há 18 meses atuando com atores não estatais e subnacionais e tenho visto bastante ambição – em especial dos Estados. Ao redor do mundo, o setor financeiro tem quase US$ 90 trilhões sob compromissos net zero.” Embora o governo brasileiro sempre tenha se orgulhado de responder por apenas (sic) 3% dos gases de efeito estufa do mundo, a mudança na forma de medição colocou esse orgulho em xeque. Antes era contabilizada apenas a contribuição da queima de combustível fóssil para as emissões. Recentemente, o think tank Carbon Brief acrescentou na conta o desmatamento e a produção de cimento, e a lista dos cinco maiores poluidores históricos mudou. Agora inclui, do maior para o menor, Estados Unidos, China, Rússia, Brasil e Indonésia.

A descentralização que Lerario observa significa que muito mais atores estão arregaçando as mangas contra o aquecimento global. Quase indiferentes a obstáculos como ideologias, movimentos anticiência e visões de curto prazo, mais pessoas, organizações não governamentais e empresas agem sem pedir licença ante estudos como o publicado na Environmental Research Letters dando conta de que o avanço do mar pelo degelo e a intensificação da erosão marinha podem afetar mais de 1 bilhão de pessoas em áreas costeiras.