Confira o artigo de Thomaz Castilho para o blog da HSM com uma reflexão sobre o mais precioso recurso urbano da atualidade
Há alguns anos, uma foto da sala de estar da apresentadora e modelo Ana Hickmann ganhava a internet, se tornando um dos mais compartilhados memes de 2017. Mas não foi branco impecável dos móveis, os animados convidados ou mesmo a lareira acesa que havia chamado a atenção das pessoas. Sem querer, Ana havia incentivado uma reflexão empírica sobre o mais valioso recurso urbano da atualidade: o espaço físico.
A gestão do espaço sempre foi um tópico obrigatório nas relações sociais e de trabalho. Com o fenômeno de crescimento das cidades, o surgimento das metrópoles e conurbações (quando duas cidades crescem ao ponto de se fundirem fisicamente. ex.: São Paulo + Guarulhos), se tornou questão ainda mais importante. De poucos anos para cá, tem se mostrado uma questão de sobrevivência; entender seu espaço hoje é, fatalmente, reconsiderar sua relação com o consumo e com a forma de se fazer negócio. Listo abaixo alguns pontos importantes (breves e despretensiosos, aliás!) para a reflexão do espaço como elemento fundamental para se pensar em negócios, sociedade e cultura.
1) Ressignificação do espaço (ou “quanto mede o meu quadrado”)
Na segunda metade do século XX e no começo do XXI, o Brasil e o mundo viveu uma torrente de mudanças sociais que culminaram em alterações profundas de como nós entendemos a dinâmica do espaço. Veja só: a partir da década de 1960, começava a se tornar mais e mais comum as chamadas “famílias fragmentadas”; um casal que se divorcia precisa reavaliar sua relação de moradia, assim como um jovem adulto que sai da casa dos pais pela primeira vez, ou os avós que voltam a morar com os filhos por questões financeiras e vários outros exemplos comuns e até familiares a maior parte das pessoas. A mudança do paradigma social de família, comum e inalterado no imaginário popular desde os tempos do Império Romano, começava a se transmutar em novas formas de se pensar sua relação com os seus. E, com isso, readequar sua relação com o espaço de convivência se tornou obrigatório.
2) A autossuficiência
No episódio 57 do podcast CBN Professional, a palestrante e autora de best-sellers, Martha Gabriel, uma das maiores mentes pensantes no Brasil acerca do futuro das tecnologias, aponta uma característica muito interessante dos nossos tempos e que influencia diretamente nossa relação com a utilização e entendimento do espaço:
“(...) alguns estudos dizem que, em função das tecnologias digitais, tendemos a ter mais poder e toda a informação do mundo por meio destas tecnologias; e aí começamos a ter poder mesmo quando estamos sozinhos. Então o isolamento tem se tornado uma tendência e há pesquisadores que pensam que isso tende a ser um traço evolutivo do ser humano.”
O isolamento pessoal não é necessariamente uma novidade, mas, como Martha afirma, ele tende a crescer exponencialmente com a tecnologia em nossas mãos. Um exemplo disso é uma pesquisa da Common Sense Media, que aponta uma considerável parcela de adolescentes com idade entre 13 e 17 anos que já prefere se comunicar por texto ou redes sociais com seus amigos. Com a autossuficiência em questão (de aprender, se informar, se comunicar, se locomover ou mesmo se alimentar), pensar o espaço físico se tornou um exercício criativo, curioso e, por que não, literalmente desconfortável para muita gente. Como os apartamentos de 14m2 em São Paulo, com vendas rapidamente esgotadas e que deram o que falar; ou mesmo casos ainda mais extremos no Japão, país tão acostumado à reflexão espacial urbana.
3) Um business environment menos vaidoso
Em 1989, o empresário inglês Mark Dixon havia experimentado o gatilho comum de 9 entre 10 empreendedores: uma experiência desconfortável; como viajava demais, via sua produtividade muito impactada pelo fato de não encontrar espaços para trabalhar nos países que visitava, tendo de se contentar com os quartos de hotéis pelos quais passava (estamos falando de uma época em que a internet era uma realidade apenas para as universidades). Nascia então a Regus, um das pioneiras na reflexão do espaço físico como uma commodity, reduzindo custos estruturais para empresas e executivos(as) que agora teriam o impacto de produtividade minimizado em casos como o vivido pelo próprio Dixon. A segunda década do século XXI, esta em que ainda estamos, vivenciou um aquecimento exponencial deste mercado com o surgimento de players bastante poderosos e globais como a WeWork, hoje com alguns escritórios no Brasil e com uma contínua elevação na demanda por estações de trabalho.
Entre as boas características que a cultura de startups trouxe ao mercado estão a desglamourização do escritório e a troca da sala de reunião pelo e-mail. As opções de co-working refletem uma mudança de paradigma importante para o mercado, que acompanha a fluidez da digitalização dos negócios. Ter uma sala com seu nome na porta é hoje algo dispensável (até mesmo cafona).
Entender nossa relação com o espaço físico deixou de ser uma reflexão empírica, quase automática, para ser uma discussão central, que envolve, no que tange negócios: custo, relacionamento e cultura organizacional; no que tange pessoas: custo, bem-estar e consumo; dois tripés definidores da ressignificação do nosso espaço, seja na sala de estar da Ana Hickmann ou em 8m2 em algum lugar de Tóquio.