Há pouco mais de dois anos, apontamos oito tendências de negócios que surgiam graças à tecnologia e que estavam remodelando profundamente as estratégias de empresas em muitos setores de atividade. Mostramos, então, como os efeitos da combinação entre tecnologias emergentes baseadas na internet, o poder crescente da informática e a presença maciça da comunicação digital estavam plantando outras formas de gerir talentos e ativos, assim como um novo pensamento sobre estruturas organizacionais.

Desde então, o cenário tecnológico continuou a evoluir rapidamente. Em apenas dois anos, o Facebook multiplicou por cinco seu tamanho e hoje é uma rede com mais de 500 milhões de usuários. Mais de 4 bilhões de pessoas em todo o mundo usam telefone celular e, para 450 milhões, a web é uma experiência totalmente móvel.

O ritmo alucinante da mudança afetou nossas oito tendências originais, que continuaram se espalhando –muitas vezes, em velocidade maior do que a prevista– e mudando de formas inesperadas. O número de tendências cresceu –são dez.

Desafio para as lideranças

O ambiente tecnológico em rápida mudança levanta sérias questões para os executivos sobre como contribuir para que suas empresas capitalizem a transformação que ocorre. Para as lideranças seniores, por exemplo, não basta compreender as dez tendências apontadas aqui. É preciso que elas pensem estrategicamente sobre como adaptar a gestão e as estruturas organizacionais para atender às novas demandas.

No caso das primeiras seis demandas, é importante determinar a responsabilidade por identificar as consequências específicas de cada tema para as áreas funcionais e unidades de negócios. O impacto dessas seis tendências geralmentevaria de forma considerável nos diferentes setores da organização e deve ser gerido de acordo com essa característica.

Mas somente a responsabilização não basta. Uma vez que a maioria dessas tendências atravessa as fronteiras internas da organização, a alta gerência deve catalisar encontros regulares entre equipes de diferentes áreas da empresa que enfrentam problemas similares.

As três tendências seguintes (de números 7, 8 e 9) sinalizam transformações de alcance ainda maior no ambiente de negócios e isso pode requerer mudanças radicais na estratégia. Presidentes de empresa e seus subordinados diretos precisam atacar essas questões. Caso contrário, será quase impossível gerar ideias marcadas pela interdisciplinaridade, tão amplas quanto a empresa, e que são necessárias para explorar essas tendências plenamente.

Uma vez que as oportunidades comecem a surgir, os executivos seniores também devem transformar sua organização em laboratório capaz de rapidamente testar as ideias em pequena escala para em seguida, de forma ágil, expandir o sucesso.

Por fim, no caso da décima tendência, a de usar a tecnologia para melhorar as comunidades e gerar benefícios sociais, são necessárias ações não apenas de lideranças empresariais, mas também de governos, ONGs e cidadãos.

1. Criação coletiva ocupa papel central

Nos últimos anos, a capacidade de organizar comunidades de internautas para desenvolver, comercializar e dar suporte a produtos e serviços passou das áreas marginais da empresa para o centro da vida corporativa. Entre executivos que ouvimos recentemente, 70% disseram que sua empresa cria valor regularmente por meio de comunidades na web. Na mesma linha, mais de 68 milhões de blogueiros publicam críticas e sugestões sobre produtos e serviços.

A Intuit, conhecida desenvolvedora de software para pequenas empresas, com sede na Califórnia, Estados Unidos, está entre as que utilizam a web para ampliar seu alcance e reduzir os custos no atendimento aos clientes. Abriga, por exemplo, comunidades de apoio a clientes no uso de seus produtos para pagamento de impostos. Nessas comunidades, clientes mais experientes dão conselhos àqueles que precisam de ajuda. Os colaboradores mais ativos são reconhecidos pela comunidade, pois é possível visualizar o número de questões a que responderam e os agradecimentos de outros usuários. Segundo nossas estimativas, quando comunidades se encarregam de resolver uma questão, o custo de cada contato pode cair para 10% do custo de resolver o mesmo problema por meio do tradicional call center.

No entanto, há também casos de fracasso. Algumas empresas são negligentes na pesquisa para identificar potenciais participantes que possuem as habilidades certas e que se sentirão motivados a integrar a comunidade no longo prazo. Como a criação coletiva é um processo de duas mãos, as empresas devem também oferecer feedback, para estimular a participação contínua e o comprometimento. Dar os incentivos certos é importante: esses cocriadores geralmente valorizarão mais a reputação do que o dinheiro.

2. A organização vira uma grande rede

Em nossas primeiras previsões, já havíamos observado que a internet estava pressionando as fronteiras das organizações, permitindo que não funcionários oferecessem seu expertise de novas maneiras.

Agora, muitas empresas estão indo bem além, desenvolvendo e gerenciando redes flexíveis que cruzam as fronteiras internas, e mesmo externas, da organização.

A recessão demonstrou o valor desse tipo de flexibilidade na gestão da volatilidade. Acreditamos que, mais porosas, as empresas em rede do futuro precisarão organizar o trabalho ao redor de tarefas críticas, em vez de moldá-lo dentro dos limites impostos pelas estruturas corporativas.

Em uma empresa de serviços de energia de atuação mundial, as fronteiras geográficas e entre unidades de negócios impediam os executivos de ter acesso aos melhores talentos da organização para resolver os problemas dos clientes. A informática dava suporte aos engenheiros, por exemplo, mas raramente oferecia soluções criativas para a maioria das dificuldades.

Por meio da análise da rede de relacionamentos interna, a empresa mapeou os fluxos de informação e as fontes de conhecimento entre seu pessoal em todo o mundo. A análise identificou vários gargalos, mas também um conjunto de soluções. Valendo-se das tecnologias de internet, a empresa expandiu o acesso a especialistas no mundo inteiro e criou comunidades de inovação reunindo diferentes unidades de negócios. As novas redes aumentaram a velocidade do atendimento e a qualidade em 48%, segundo pesquisa da empresa.

A ortodoxia dos gestores ainda impede que a maioria das organizações aproveite os talentos que estão fora dos limites do quadro de funcionários. Programas-piloto que conectem as pessoas através das fronteiras organizacionais são uma boa forma de experimentar novos modelos, mas as estruturas de incentivo devem ser reformadas, e os modelos de comportamento estabelecidos, para que esses programas funcionem.

A ortodoxia dos gestores ainda impede que a maioria das organizações aproveite os talentos que estão fora do quadro de funcionários. é preciso haver Programas--piloto de conexão e novas estruturas de incentivo

3. Colaboração em escala

As tecnologias de colaboração prometem aumentar a eficiência e a eficácia dos trabalhadores do conhecimento. Muitas empresas têm experimentado tais tecnologias, como atesta o rápido crescimento do uso de videoconferência e conferência pela web (espera-se que a alta seja de até 20% por ano nos próximos cinco anos).

Uma empresa de alta tecnologia cuja área de vendas dependia de muitas viagens decidiu empregar ferramentas de colaboração, entre elas videoconferência e áreas de trabalho eletrônicas compartilhadas, o que permitiu que funcionários em diferentes localidades trabalhassem com o mesmo documento simultaneamente. A economia com a redução das viagens foi quatro vezes maior do que o investimento em tecnologia e o número de contatos por vendedor cresceu 45%.

Em outro exemplo, a área de inteligência do governo norte-americano criou wikis e blogs, disponíveis para analistas em várias agências, com as medidas de segurança apropriadas, é claro. O resultado foi maior troca de informações e mais rápido acesso aos especialistas certos na comunidade de inteligência.

Apesar desses casos de sucesso, muitas empresas erram ao acreditar que a tecnologia por si só aumentará a colaboração. Para que a tecnologia seja eficaz, as organizações precisam primeiro compreender melhor como o trabalho do conhecimento ocorre. O ponto de partida deve ser o mapeamento dos caminhos informais pelos quais a informação trafega, como os funcionários interagem e onde estão os gargalos.

4. O crescimento dos equipamentos de internet

Uma série de equipamentos baseados na internet tem surgido e se transformado em elementos de sistemas de informação, com capacidade de captar, processar, comunicar e compartilhar dados. Sensores e equipamentos de comunicação, por exemplo, em breve serão capazes de receber e transmitir informações em escala e, em alguns casos, se adaptar e reagir a mudanças do ambiente automaticamente. Esses ativos “inteligentes” podem tornar os processos mais eficientes, conferir novas capacidades aos produtos e disseminar outros modelos de negócio.

Seguradoras de veículos na Europa e nos Estados Unidos estão fazendo experiências nesse campo, como a oferta de instalar sensores nos carros dos clientes. O resultado são novos modelos de precificação, que calculam o risco com base no comportamento do motorista em vez de fazê-lo a partir do perfil dele (se é homem ou mulher, por exemplo).

Fabricantes de carros de luxo estão equipando os veículos com sensores em rede capazes de adotar ações evasivas automaticamente diante do risco de um acidente. Na medicina, sensores colocados nos pacientes enviam aos médicos regularmente dados sobre mudanças nas condições de saúde. Os profissionais de saúde, por sua vez, podem fazer ajustes nos tratamentos quando necessário.

À medida que começam a surgir padrões de segurança e interoperabilidade, algumas tecnologias essenciais para esses equipamentos baseados na internet se tornam amplamente disponíveis. A gama de aplicativos possíveis e o impacto deles nos negócios, porém, ainda não foram plenamente explorados.

5. Experimentação e o grande banco de dados

A empresa poderia se tornar um laboratório em tempo integral? O que aconteceria se ela fosse capaz de analisar cada transação, captar observações de cada interação com o cliente, e não ter mais de esperar meses para receber os dados de pesquisas de campo?

Os dados estão disponíveis a taxas nunca vistas –dobrando cada 18 meses– em consequência do enorme acesso a informações dos consumidores, de fontes públicas ou privadas, assim como novas informações reunidas em comunidades da web e transmitidas por equipamentos inteligentes.

Essa tendência é conhecida como “o grande banco de dados”. A tecnologia para captar e analisar informações está amplamente disponível a preços cada vez menores. Mas muitas empresas estão levando o uso dos dados para novos patamares, lançando mão da tecnologia da informação (TI) para dar apoio à experimentação rigorosa e constante para guiar decisões e para testar novos produtos, modelos de negócio e inovações.

Empresas do mundo virtual, como Amazon, eBay e Google, foram pioneiras nesse campo, testando fatores que impulsionam o desempenho –de onde colocar os botões numa página da web à sequência mais adequada do conteúdo oferecido– para determinar o que aumenta as vendas e o envolvimento dos usuários.

6. Conectando por um mundo sustentável

A sustentabilidade está se tornando rapidamente uma importante métrica de desempenho do mundo corporativo, levada em consideração por grupos de interesse, formadores de opinião e até mesmo pelos mercados financeiros.

Nesse contexto, a TI desempenha um papel duplo: é, ao mesmo tempo, fonte de emissões de carbono e fator-chave de muitas estratégias para minorar os danos ambientais.

As empresas que estão dando os primeiros passos para reduzir o impacto ambiental de suas atividades de TI, por exemplo, vêm adotando tecnologias “verdes” nos data centers. Elas pretendem reduzir significativamente a demanda por energia de seus servidores –que crescem para dar conta de tendências como as já mencionadas (a criação coletiva e os equipamentos baseados na internet, por exemplo).

O papel mais importante da TI, entretanto, reside em sua capacidade de reduzir a pressão sobre o meio ambiente das atividades econômicas como um todo. Um avanço significativo, por exemplo, foi a disponibilização de mecanismos que permitem que os consumidores mudem seu padrão de uso de eletricidade, evitando os períodos de pico e, assim, reduzindo a energia gerada por instalações ineficientes voltadas para a demanda dos horários de pico.

De forma similar, prédios inteligentes com recursos de TI monitoram e otimizam o uso da energia e representam uma das formas mais relevantes de redução do consumo de energia nas economias desenvolvidas.

7. Qualquer coisa pode ser um serviço

A tecnologia agora permite que as empresas monitorem, mensurem, personalizem e cobrem pelo uso de ativos de maneira muito mais refinada. Os donos dos ativos podem, portanto, criar serviços em torno do que tradicionalmente era vendido como produto.

Os clientes B2B apreciam essa possibilidade porque permite que as empresas adquiram unidades de um serviço e contabilizem esse gasto como custo variável em vez de lançar mão de grandes investimentos de capital. Os consumidores também gostam da modalidade “pague apenas pelo que você usar”, pois isso os ajuda a evitar grandes gastos e o inconveniente de comprar e manter um produto.

Na área de TI, o crescimento da computação em nuvem (o acesso a recursos de informática fornecidos por meio de redes em vez de rodar softwares ou armazenar dados no próprio computador) exemplifica essa mudança.

Exemplo de negócio de múltiplos lados é a Sermo, comunidade online de discussões de médicos; indústria; indústrias farmacêuticas, planos de saúde, bancos e governo pagam pelo acesso às interações

8. A era dos negócios de múltiplos lados

Os modelos de negócio de múltiplos lados criam valor pelas interações entre múltiplos participantes, em vez de por transações ou trocas de informação um a um. No setor de mídia, a publicidade é um exemplo clássico de como esses modelos funcionam. Jornais, revistas e redes de TV oferecem conteúdo a seus públicos e geram grande parte de sua receita a partir da interação com uma terceira parte: os anunciantes. Outra fonte de receita geralmente são as assinaturas que vêm diretamente dos clientes. Mais recentemente esse modelo financiado pela propaganda proliferou na internet.

A tecnologia está propagando novas formas de negócios de múltiplos lados, igualmente significativos. Por exemplo, os dados reunidos de um conjunto de usuários podem gerar receita quando a empresa cobra um conjunto específico de clientes por serviços de informação baseados nesses dados.

Esse é o caso da Sermo, comunidade online de médicos que aderem (sem pagar nada por isso) para levantar questões para outros membros, participar de grupos de discussão e ter acesso a artigos científicos. Outras partes, como indústrias farmacêuticas, planos de saúde, instituições financeiras eórgãos do governo pagam pelo acesso a interações anônimas e pesquisas entre os membros da Sermo.

À medida que mais pessoas migram para atividades online, o efeitos de rede pode ampliar o valor dos modelos de negócio de múltiplos lados. O raciocínio também se aplica a modelos em que um grupo de clientes tem acesso a serviços gratuitos por conta daqueles que pagam pelo uso premium. Exemplos conhecidos são o Flickr (armazenamento online de fotos) e o Skype (comunicação online).

9. Inovação na base da pirâmide

A adoção de novas tecnologias é um fenômeno mundial e a intensidade de seu uso é ainda mais impressionante nos mercados emergentes. Nossa pesquisa indica que modelos de negócio de ruptura surgem quando as tecnologias se recombinam em condições de mercado extremas, como a demanda dos consumidores por preços muito baixos, infraestrutura precária, fornecedores distantes e talentos a baixo custo.

Com a recuperação econômica dando seus primeiros passos em algumas partes do mundo, altas taxas de crescimento têm sido verificadas em muitos países em desenvolvimento, e temos observado empresas sendo criadas a partir de novos modelos e se destacando como concorrentes de âmbito mundial. Muitas multinacionais, por sua vez, estão só começando a pensar sobre os mercados em desenvolvimento como fontes de inovação basea-da em tecnologia, em vez de apenas como polos de manufatura.

Para as corporações dominantes, as centenas de empresas que estão surgindo no cenário global a partir de mercados emergentes representam um novo tipo de concorrente: elas não apenas desafiam os planos de crescimento do líder no mercado em desenvolvimento, mas também exportam seus modelos radicais para os mercados já desenvolvidos. Para responder, as empresas de atuação mundial devem se conectar às redes locais de empreendedores, negócios de rápido crescimento, fornecedores, investidores e formadores de opinião que contribuem para a disseminação dos novos modelos.

10. Produção de bens públicos

O papel dos governos no estabelecimento da política econômica mundial tende a se ampliar nos próximos anos. A tecnologia será um fator importante nessa evolução, por facilitar novos tipos de bens públicos, ao mesmo tempo que contribui para que sejam geridos de forma mais eficiente.

Veja o caso dos desafios trazidos pela urbanização crescente. Cerca de metade da população mundial vive em áreas urbanas e esse percentual deve subir para 70% por volta de 2050. Políticas públicas criativas que incorporem novas tecnologias podem ajudar a reduzir as pressões sociais e econômicas da densidade populacional. Londres, Singapura e Estocolmo, por exemplo, têm usado equipamentos inteligentes para gerir o trânsito nas regiões de maior fluxo de carros.

O papel dos governos na política econômica mundial tende a se ampliar e A tecnologia será importante nisso, por facilitar a existência de novos tipos de bens públicos e possibilitar que sejam geridos de modo mais eficiente