Empresas de pequeno e médio portes conseguem internacionalizar-se em mercados de rápido crescimento? No Canadá, são organizações menores que lideram esse avanço, em mercados como Tailândia, Índia, Singapura, Hong Kong e Vietnã.

Fizemos pesquisa de ordem qualitativa com sete empresas –cinco canadenses e duas britânicas– bem-sucedidas na internacionalização em países emergentes:

• Forrec (www.forrec.com): desenha ambientes de entretenimento de lazer. Conseguiu atuar na Ásia nos anos 1980 e, mais recentemente, na América do Sul e no Oriente Médio.

• Intelysis (www.intelysis.com): é especializada em investigar fraudes e corrupções corporativas, fazer due diligence etc. Faz negócios no Caribe desde 2004 e no Brasil.

• Novo Plastics (www.novoplas.com): fabrica componentes de plástico para várias indústrias, como a automobilística, incluindo uma linha ecológica. Atua na Índia desde 2009.

• Sandvine (www.sandvine.com): fornece equipamentos de rede e soluções para provedores de serviços wireless. Atua em 85 países, incluindo o Brasil –iniciou na Europa, Oriente Médio e África em 2003.

• Trojan Technologies (www.trojanuv.com): fornece tratamento de água com raios ultravioleta ecologicamente corretos e serviços afins. Atua na América do Sul e no Oriente Médio.

• J&D Wilkie (www.jdwilkie.co.uk): faz tecidos para as áreas de defesa, médica e comercial. Chegou à China em 2004.

• Mylnefield Research Services (www.mrsltd.com): realiza pesquisas em agronegócios e licencia variedades de plantas. Começou a operar na China em 2006.

A seguir, mapeamos os principais desafios que tiveram de superar e os cinco aspectos aos quais atribuem seu êxito.

Desafios superados

1-Político-econômicos

Custo de fazer negócios – Inclui o peso da burocracia e da papelada, em geral maior nos mercados emergentes.

Política, corrupção e relações com governo – Isso pode trazer perdas e atrasos nos projetos. Trabalhar com governos é um processo lento, o que impacta negativamente o fluxo de caixa.

Segurança (de propriedade intelectual, ativos e pessoas) – A aposta em patentes não tem a mesma validade em um mercado emergente (tende a ser mais difícil proteger a propriedade intelectual). Mesmo que uma empresa identifique um caso de cópia, a relação custo-benefício de localizar seu autor e entrar na Justiça contra ele pode não ser favorável. As companhias dependem de mecanismos informais de controle para se proteger contra as imitações (tais como premiar relações de longo prazo e a inovação).

Em regiões com alto índice de criminalidade, os gestores precisam estar particularmente atentos à segurança de seu pessoal e seus ativos.

Defesa informal
Patentes não costumam proteger o negócio em mercados emergentes; mais valem acordos de fidelidade

Acesso a financiamento – Muitas pequenas empresas enfrentam problemas para conseguir financiamento internacional para expandir suas atividades para o exterior, especialmente quando querem entrar em mercados de rápido crescimento. Bancos e investidores costumam enxergar a atuação nessas economias como um risco.

2- Socioculturais

Diferenças de língua e cultura, que podem travar os relacionamentos – Barreiras de idioma nunca devem ser minimizadas. Traduzir materiais informativos e site em muitas línguas custa dinheiro e leva tempo. Mais importante, barreiras de língua inibem o estabelecimento de relações pessoais, o que é ruim, porque os laços mais efetivos são criados entre pessoas. Se ambas as partes dependem de intérpretes para dialogar, o contato harmonioso é ainda mais difícil.

Diferenças de práticas de negócio – Isso pode afetar a formação e a gestão de parcerias.

Dificuldade para obter informações sobre oportunidades e condições de mercado – Isso ocorre porque as melhores fontes de informação dependem das relações interpessoais.

Falta de credibilidade – A companhia tende a ser considerada “um risco” pelos potenciais parceiros e clientes em um novo mercado. Se houver muitas empresas internacionais competindo ali, pode ser difícil fazer com que esses parceiros e clientes prestem atenção ao participante desconhecido.

Diferenciais percebidos

1- Manter vantagem tecnológica

As organizações com melhor desempenho nos mercados de rápido crescimento são aquelas que conseguem se manter inovadoras, com vantagem tecnológica sobre os concorrentes. É mais difícil e mais custoso imitar pequenas e médias empresas que estão sempre oferecendo algo único ao mercado.

A vantagem tecnológica também possibilita que a companhia pratique preços mais altos e aumente sua reputação, além de ter acesso a novos mercados.

Esses mercados se caracterizam por poucos grandes concorrentes e muitos participantes de menor porte. Como a demanda está crescendo em ritmo acelerado, mas de modo imprevisível, os varejistas são cautelosos em se comprometer com um esquema de preços variáveis.

Assim, as empresas têm encontrado vantagens em oferecer custos fixos e contratos de dois a três anos, permitindo que seus clientes calculem o custo de atender o consumidor final. No entanto, as pequenas e médias empresas precisam ser capazes de fazer estimativas de demanda relativamente precisas, para que esse esquema seja lucrativo.

2- Selecionar estrategicamente

Ser seletivo é particularmente importante nos estágios iniciais dos negócios em mercados de rápido crescimento, porque uma atuação abrangente, nas atividades ou na geografia, é desafiadora demais para uma empresa inexperiente.

Em primeiro lugar, deve-se decidir sobre o que manter no local de origem e o que transferir para o exterior.

Em segundo lugar, escolhe-se o lugar de destino, levando em conta a qualidade e a capacidade de resposta do governo local, aspectos que podem ter impacto significativo na transparência e na facilidade de fazer negócios ali. É importante, por exemplo, levantar que outras companhias estrangeiras operam em uma localidade antes de optar pelo destino.

Em terceiro lugar, define-se a localização dentro do país de destino, uma vez que muitos países com economia em crescimento acelerado possuem grandes dimensões e uma rede de transporte ruim.

O timing é a quarta seleção a fazer. As condições são mais atraentes para entrar em um novo mercado em certos momentos que em outros.

Pequenas e médias empresas também precisam prestar atenção ao passo a passo desse ingresso. Embora isso possa acontecer de modo lento, com idas e vindas, aprender como fazer negócios em um cenário de rápido crescimento será valioso na investida em outros mercados semelhantes.

Ser seletivo
Isso é crucial nos estágios iniciais da internacionalização de uma empresa pequena, com a escolha do que transferir, do lugar, do momento

3- Desenvolver reputação global

Isso pode ser conseguido, por exemplo, com a participação em eventos de escala mundial sobre o setor de atuação da empresa, onde há oportunidades de estabelecer contato com especialistas locais –essa participação, porém, tende a ter um custo alto. Vale lembrar que pequenas e médias empresas podem se valer muito da comunicação online. Outro caminho é integrar missões comerciais de alto nível. [Veja o quadro na página anterior, sobre a Apex-Brasil.]

4-Entender os mercados locais

Agências comerciais podem oferecer informações valiosas quando se trata de alcançar esse objetivo. Por exemplo, o China-Britain Business Council (CBBC), uma organização comercial privada, possui muitos escritórios e possibilita que pequenas e médias empresas façam parte dele por um custo relativamente baixo. [Veja o quadro na página anterior, sobre a Apex-Brasil.]

5- Construir “pontes”

Mediadores podem ajudar no aprendizado sobre o novo mercado, além de contribuir para que o próprio mercado local saiba mais sobre a empresa que está chegando, reduzindo riscos. Um caminho comum é estabelecer uma parceria com um representante local, que não apenas dá uma “cara” para a empresa, como lhe fornece informações de valor incalculável. Esse representante também pode ajudar na venda de projetos.

Um segundo caminho é entrar no novo mercado por meio de um cliente atual ou outra parceria que a empresa eventualmente já tenha estabelecido no país de origem.

Por fim, também é possível utilizar a ponte representada por acordos comerciais entre governos de dois países.

PMEs brasileiras exportam cada vez mais, segundo a Apex-Brasil

Entre 2012 e 2013, exportações das pequenas empresas para a china cresceram 70%

Há amplo consenso sobre a necessidade de o Brasil aumentar suas exportações. Há também um claro entendimento de que, para isso, é preciso investir em inovação tecnológica, de maneira a garantir vantagens competitivas no inquieto cenário internacional, que se altera com rapidez e nem sempre de modo previsível. No entanto, a inovação está atrelada a aumento de custos, pois é preciso investir para alcançar resultados.

Essa visão tem sido cada vez mais assimilada pelo pequeno empresário brasileiro. Vemos exemplos estimulantes de empresas que já nascem ancoradas na ambição de inovar. Com a ajuda de programas organizados por entidades setoriais e órgãos como a Apex-Brasil, algumas se descobrem aptas a ocupar espaço em mercados vizinhos –que demonstram crescimento acentuado– e também nos distantes.

A primeira notícia pode não ser muito boa: registra-se queda no número de pequenas empresas que exportam. Mas, entre 2011 e 2013, verifica-se aumento anual no valor exportado por empresas de pequeno porte. E o destino não são apenas os países da América do Sul; nota-se expansão nas exportações para a Ásia, onde cresce a demanda por produtos diferenciados.

No montante vendido à China por pequenas empresas brasileiras, por exemplo, observamos, entre 2012 e 2013, aumento de 70,66%. Para Hong Kong, um “hub” do mercado asiático, esse percentual atinge 85%. Entre os países latinos, o único que mostra queda nas compras de empresas brasileiras é a Argentina. Peru, que desperta cada vez mais interesse entre os empresários do Brasil, comprou, em valor, 54% a mais em 2013, comparativamente a 2012.

A variedade de setores demonstra vigor nas vendas: calçados, confecções, instrumentos de óptica e precisão, móveis, geradores e transformadores, autopeças, leite e derivados, entre outros, estão sendo exportados.

As mudanças

Nos últimos anos, ocorreram grandes transformações no ambiente internacional de negócios. A globalização se intensificou, dando origem a mercados competitivos e interdependentes, que elegem novas tecnologias como fator político e econômico de desenvolvimento. É preciso ter consciência de que tais mudanças criam oportunidades e, igualmente, obstáculos. Assim, empresas de pequeno porte que buscam expandir-se além das fronteiras vão se confrontar com o incômodo de encarar situações adversas e complicadores para seu sucesso.

Nossa experiência mostra, contudo, que, quanto mais dúvidas, maior a possibilidade de êxito –e não de desistência. Desprezar informações ou desconsiderar riscos são as atitudes que podem levar ao retrocesso.

Quanto ao investimento financeiro necessário, isso vai variar conforme o perfil da empresa, o produto, o mercado que vai prospectar, mas, em todos os casos, a empresa precisará se preparar para o mercado externo.

O ponto fundamental é que ela se dedique a planejamento, organização e tempo; a definição de uma proposta de valor clara, uma equipe preparada em todas as áreas e o desenvolvimento de novas competências contribuem decisivamente para isso. O acesso a informações qualificadas também é essencial para um resultado positivo.

Programas como o Projeto Extensão Industrial Exportadora (Peiex) ajudam muito nesse processo: uma empresa atendida pelo programa consegue participar de várias ações de promoção, como missões empresariais e rodadas de negócios com compradores estrangeiros, com três a quatro anos de preparação.

Os estudos de inteligência comercial que a Apex-Brasil e as entidades setoriais realizam, somados às ações de qualificação e, acima de tudo, às iniciativas de promoção comercial, como a primeira missão empresarial para pequenas empresas à

Colômbia e ao Peru em maio passado, vêm suprindo demandas que o mercado internacional impõe. Aprender com desafios é fator essencial para a sustentabilidade, e o desafio da internacionalização é um ótimo mestre. 

Por Maurício Borges, presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), órgão governamental voltado a internacionalizar a economia.